Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quinta-feira, 22 de dezembro de 2016

Antônio Simões dos Reis - Flores do Natal

De um poeta sergipano que, a seu tempo, foi considerado um dos maiores bibliófilos brasileiros, temos este longo poema com quadras rimadas apenas no segundo e quarto versos de cada estrofe, cujo tema é a linda manhã de um dia de Natal.

Um dia de Natal, é bom que se diga, num país de clima tropical, como o Brasil, haja vista que as cenas descritas pelo poeta são luminosas, com céu azul e muito vento a açoitar as moitas dos capinzais, em pleno dezembro.

J.A.R. – H.C.

Campo de Papoulas Vermelhas
(Valery Rybakow: pintor bielorusso)

Flores do Natal

À Exma. Sra. Dª Narcisa Amália

Ah, vinde ver como é linda
esta manhã de Natal!
O vento passa e murmura
nas moitas do capinzal!

Quantas flores pelo mato!
quanto regato a correr!
quanta harmonia nos ares,
à hora do amanhecer!

Canta o grilo no folhiço,
canta a cigarra também
e ouve-se o canto das aves
das outras bandas de além.

Tudo é bonito e festivo;
parece o céu mais azul;
somente um cirrus rendado
se dirige para o sul.

O pau d’arco da fazenda,
inda ontem tão despido,
vestiu-se de flores roxas,
e amanheceu tão garrido,

que a gente, ao vê-lo,
parece sentir n’alma um desafogo,
e o sabor das amarguras
esquece-se desde logo.

Ah, vinde ver! O sereno
escorre mais transparente
por sobre as flores cheirosas
da pindobeira nascente.

Vinde comigo. A fazenda
rumoreja satisfeita,
toda enfeitada de murta,
que em arcos verdes se ajeita.

As flores rescendera tanto
por aqui em de redor,
que não há cheiro que seja
mais são, mais grato e melhor.

É um gosto olhar o mato
tão lustroso e verde, assim,
como se um óleo aromático
ele escorresse de si.

Ali, no pátio do rancho
maior de toda a fazenda,
com umas palmas de pindoba,
armou-se espaçosa tenda.

Socou-se o chão bem certinho,
puseram folpas por cima,
e agora, aos sons da viola
turba de negros se anima.

No salão desafogado
da casa-grande ajeitaram
um presepe, com umas varas
flexíveis que encurvaram.

E ali, em redor da lapa,
está um grupo embasbacado,
mirando atento os bonecos
de papelão recortado:

A matutina morena,
corada, forte e bonita,
com o seu cabelo enrolado,
e seu vestido de chita,

beija contrita o menino
que na lapa está deitado (*),
olhando tímida, a furto,
o noivo que se acha ao lado.

Tudo é tão plácido e alegre!
Faz tão bem ao coração
olhar toda aquela gente
em fervorosa oração!

Ah, vinde ver como é linda
esta manhã de Natal!
quando passa o vento murmura
nas moitas do capinzal.

Viana, dezembro de 1871
(Celso Magalhães)

Em: “A República”; Rio de Janeiro; 15 jun. 1872.

Vendedor de Flores no Natal
(Tom Roberts: artista australiano)

Nota:

(*) Versos de uma cantiga popular.

Referência:

REIS, Antônio Simões dos. Flores do Natal. In: __________. Narcisa Amália. Rio de Janeiro: Organizações Simões, 1949. p. 172-174. (Coletânea “A Poetisa e os Poetas”, de Celso Magalhães; II. Bibliografia Brasileira; I. Narcisa Amália)



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