O poema abaixo, apesar de possuir um título que remete de imediato ao
fenômeno meteorológico da neve, diz respeito, notória e mais propriamente, à
guerra que, à época do autor, devastava a dinastia Tang, alinhando-se desse
modo à influente tradição chinesa de poesias com fundo militar ou bélico e os
seus consectários de devastação e carências.
A evocação da natureza é imediata, manifesta, explícita na poesia de Du
Fu: assim, consegue ele tecer paralelos com o seu próprio estado de espírito,
correlacionando às lufadas de neve efeitos similares aos de tormentos
lancinantes d’alma.
J.A.R. – H.C.
(712 d.C. - 770 d.C.)
对雪
戰哭多新鬼,愁吟獨老翁。
亂雲低薄暮,急雪舞回風。
瓢棄尊無綠,爐存火似紅。
數州消息斷,愁坐正書空。
Contemplando a neve
(Julia Sweda: artista
norte-americana)
Contemplando a neve
Batalhas, soluços,
novos e velhos
fantasmas.
Triste e só, um velho
recita poemas,
ao diáfano crepúsculo.
Em meio a nuvens
baixas
a neve, de repente,
dança no turbilhão do
vento.
Joguei fora a concha
de vinho,
pois a jarra está
vazia
e, no braseiro, só há
lembrança
de brasas ardentes.
Nenhuma notícia
de numerosas
províncias.
Com o dedo, garatujo
no ar
a palavra dor.
Referência:
FU, Du. 对雪 /
Contemplando a neve. In: __________. Poemas
clássicos chineses: Li Bai, Du Fu e Wang Wei. Edição bilíngue. Tradução e
organização de Sérgio Capparelli e Sun Yuqi. Prefácio de Leonardo Fróes. Porto
Alegre, RS: L&PM, 2012. Em chinês: p. 114; em português: p. 115. (Coleção
‘L&PM Pocket’; v. 1.048)
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