Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

sexta-feira, 2 de dezembro de 2016

Manuel Bandeira - Nova Poética

O poeta rejeita a concepção de que a poesia deva servir como lenitivo para as dores da vida, muito embora ela possa, por vezes, também ser “orvalho” – vivenciado por aqueles que são ponto fora da curva em relação ao áspero ou ao inclemente da realidade.

Revela desse modo a poesia não apenas o lado belo da vida, como também a sua faceta mais “sórdida” ou “suja”: o sujeito que sai de casa com a roupa de brim branco muito bem engomada tem, assim, o seu programa sustado de forma inopinada, quando um caminhão lhe lança lama nas vestes. Assim também o fenômeno poético, a causar impacto e surpresa no leitor, levando-o ao “desespero”.

J.A.R. – H.C.

Manuel Bandeira
(1886-1968)
Caricatura de Paulo Cavalcante

Nova Poética

Vou lançar a teoria do poeta sórdido.
Poeta sórdido:
Aquele em cuja poesia há a marca suja da vida.
Vai um sujeito.
Sai um sujeito de casa com a roupa de brim branco
muito bem engomada, e na primeira esquina
passa um caminhão, salpica-lhe o paletó
ou a calça de uma nódoa de lama:
É a vida.

O poema deve ser como a nódoa no brim:
Fazer o leitor satisfeito de si dar o desespero.

Sei que a poesia é também orvalho,
Mas este fica para as menininhas, as estrelas alfas,
as virgens cem por cento e as amadas
que envelheceram sem maldade.

19 de maio de 1949
Em: “Belo Belo”

Passeio pela Cidade
(Dmitri Danish: artista ucraniano)

Referência:

BANDEIRA, Manuel. Nova Poética. In: __________. Bandeira de bolso: uma antologia poética. Organização e apresentação de Mara Jardim. Porto Alegre, RS: L&PM, 2013. p. 120. (L&PM Pocket; v. 675)

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