Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

segunda-feira, 7 de novembro de 2016

Adélia Prado - Sedução

A poesia é, para a autora, tal qual amante irresistível, que não a deixa escapar aos seus engodos: lascívia e sedução que emerge depois que o “mandacaru flora lá na seca”, a produzir sulcos dos pés à cabeça por meio de sua rígida roda dentada.

O discurso sensual, presente neste poema de Adélia, não é meramente incidental, senão marca que se repete em grande parte de suas obras, juntamente com matizes religiosos e interioranos, divisas de sua indisfarçável “mineirice”.

J.A.R. – H.C.

Adélia Prado
(n. 1935)

Sedução

A poesia me pega com sua roda dentada,
me força a escutar imóvel
o seu discurso esdrúxulo.
Me abraça detrás do muro, levanta
a saia pra eu ver, amorosa e doida.
Acontece a má coisa, eu lhe digo,
também sou filho de Deus,
me deixa desesperar.
Ela responde passando
a língua quente em meu pescoço,
fala pau pra me acalmar,
fala pedra, geometria,
se descuida e fica meiga,
aproveito pra me safar.
Eu corro ela corre mais,
eu grito ela grita mais,
sete demônios mais forte.
Me pega a ponta do pé
e vem até na cabeça,
fazendo sulcos profundos.
É de ferro a roda dentada dela.

Antes da Sedução
(William Hogarth: artista inglês)

Referência:

PRADO, Adélia. Sedução. In: MONTELEONE, Jorge; HOLLANDA, Heloisa Buarque (Comps.). ARIJÓN, Teresa (Coord.). Puentes / Pontes. Antología bilingüe / Antologia bilíngue. Poesía argentina y brasileña contemporánea / Poesia argentina e brasileira contemporânea. 1. ed. Buenos Aires, AR: Fondo de Cultura Económica, 2003. p. 301.

Um comentário:

  1. Para mim, a poesia é também uma roda dentada, de ferro quente...impossível não sentí-la!!!
    improvavel não deixá-la me transformar em vida, em sangue, em volupias...

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