Anátemas que as religiões monoteístas lançam entre si: o poeta-filósofo
se encontra numa encruzilhada sobre qual rumo dar à sua vida. Entre o nascer e
o morrer, tudo são incertezas, mesmo à vista das religiões que apregoam o
caráter absoluto de suas verdades...
Abu Al-Ala é todo suspicácia acerca das conjecturas da fé e, se assim o
faz, é porque, decerto, os alicerces da razão e da prudência, em sua mente,
superam a crença fundada em doutrinas ou dogmas religiosos.
J.A.R. – H.C.
Apreciação da Obra do Autor
por Mansour Challita
Abu Al-Ala Al-Maarri
(974-1078) nasceu na pequena aldeia síria de Maarrat An-Numan. Tinha quatro
anos quando a varíola vedou seus olhos para sempre. Mas mesmo cego, “via mais
longe do que os outros homens”, afirma um de seus biógrafos. Graças ao seu
gênio e a esforços constantes, tornou-se um dos homens mais cultos de sua época
e um dos filósofos mais profundos de todos os tempos.
Sua principal obra em
prosa, A Epístola do Perdão, é uma
descrição burlesca das delícias e dos tormentos da vida no Além. Dante se
inspirou nela na sua Divina Comédia.
Suas poesias estão
reunidas em dois livros, o mais importante dos quais é Luzum Ma La lalzarn (Necessidade do que é Desnecessário), onde está
condensado, num estilo brilhante e evocativo, o pensamento definitivo do poeta.
A filosofia de Abu
Al-Ala se distingue pelo pessimismo, o cepticismo, a predominância dada à Razão
sobre a Fé, uma luta agressiva contra a injustiça e a estupidez, e uma
compaixão infinita para com todos os seres vivos. (CHALLITA, 1867, p. 262)
Abu Al-Ala Al-Maarri
(974-1078)
Versos Amargos
Erram todos:
muçulmanos, cristãos, judeus,
Dois homens apenas
formam a seita universal:
O homem inteligente,
sem religião,
E o homem religioso,
sem inteligência.
Nas suas igrejas, os
cristãos recitam as Escrituras;
Nas suas sinagogas,
os judeus salmodiam sua Thora,
Religiões que se
tornaram simples seitas, todas iguais.
Cada credo lança o
anátema sobre os adeptos dos outros credos.
Não escolhi nascer,
Não posso impedir que
envelheça ou morra.
Que mais posso
escolher?
As Três Religiões Monoteístas
Referência:
AL-MAARRI, Abu Al-Ala. Versos amargos.
Tradução de Mansour Challita. In: CHALLITA, Mansour (Escolha, tradução e
apresentação). As mais belas páginas da
literatura árabe: amor, humorismo, sabedoria, espiritualidade. Rio de
Janeiro, GB: Civilização Brasileira, 1967. p. 263.
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