Boileau e Arnauld, ambos franceses, foram contemporâneos, e na morte do
segundo, Boileau prestou-lhe homenagens por meio do epitáfio abaixo, que
permite ver, em breves traços, muito da personalidade do saudado teólogo.
Arnauld, uma das figuras mais importantes do jansenismo, foi também
filósofo e matemático, e, a seu tempo, entrou em profundas controvérsias com Descartes,
Malebranche, Leibniz e os jesuítas. Chegou mesmo a ser expulso da Sorbonne.
Ainda assim, ninguém discute a sua influência na vida intelectual da Europa do
séc. XVII. Até por isso, seus escritos, condensados posteriormente à sua morte em
42 tomos, foram amplamente divulgados e lidos durante mais ou menos meia
centúria.
J.A.R. – H.C.
Nicolas Boileau-Despréaux
(1636-1711)
Retrato de Hyacinthe Rigaud
Epitaphe
d’Arnauld
Au pied de cet autel de structure grossière,
Gît, sans pompe, enfermé dans une vile bière,
Le plus savant mortel qui jamais ait écrit;
Arnauld, qui, sur la grace instruit par
Jésus-Christ,
Combattant pour l’Église, a, dans l’Église même,
Souffert plus d’un outrage et plus d’un anathème.
Plein de feu qu’en son coeur souffla l’esprit
divin,
Il terrassa Pélage,
il foudroya Calvin,
De tous les faux docteurs confondit la morale.
Mais, pour fruit de son zèle, on l’a vu rebuté,
En cent lieux opprimé par leur noire cabale,
Errant, pauvre, banni, proscrit, persécuté;
Et mesme par sa mort leur fureur mal éteinte
N’aurait jamais
laissé ses cendres en repos,
Si Dieu lui-même,
ici, de son ouaille sainte
A ces loups dévorants
n’avait caché les os.
Antoine Arnald
(1612-1694)
Pintura de Jean-Baptiste
de Champaigne
Epitáfio de Arnald
Aos pés deste altar
de rude estrutura
Jaz, sem pompa,
confinado num ataúde modesto,
O mortal mais sábio que
jamais se voltou à escrita;
Arnauld, que, sob a
graça instruída por Jesus Cristo,
Combatendo pela
Igreja, dentro da mesma Igreja,
Foi afligido por ultrajes
e anátemas.
Pleno do fogo que em
seu coração soprou o divino espírito,
Arrasou Pelágio,
fulminou Calvino,
E desmascarou a moral
de todos os falsos doutores.
Porém, pelo fruto de
seu zelo, tem sido refugado,
Em cem lugares
oprimido por sua negra cabala,
Errante, empobrecido,
banido, proscrito, perseguido;
E mesmo depois de
morto sua fúria mal extinta
Nunca haveria de
deixar suas cinzas em repouso,
Se o próprio Deus,
aqui, pelo seu santo rebanho
A esses lobos vorazes
não houvesse ocultado os seus ossos.
Referência:
BOILEAU-DESPRÉAUX, Nicolas. Epitaphe. In: ARLAND, Marcel (Choix et commentaires). Anthologie de la poésie française. Nouvelle édition
revue et augmentée. Paris (FR): Éditions Stock, 1960. p. 450.
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