Um sonho sob a forma de um autêntico pesadelo, que somente Freud poderia
decifrá-lo, embora se presuma, à primeira vista, que diga respeito às censuras
morais impostas pela sociedade – inscritas nas “Tábuas da Lei” – aos seus partícipes.
Diga-se lá se maltratar a própria mãe não se fixa como um interdito a
quem está sob a autoridade, respeito ou jurisdição das leis, quer divinas quer
humanas?! Contudo, será mesmo que Parra teve esse sonho – ou se trata de apenas
mais um exemplar de sua antipoesia?
J.A.R. – H.C.
Nicanor Parra
(n. 1914)
Las Tablas
Soñé que me
encontraba en un desierto y que hastiado de mí mismo
comenzaba a golpear a
unamujer.
Hacía un frío de los
demonios; era necesario hacer algo,
hacer fuego, hacer un
poco de ejercicio;
pero a mí me dolía la
cabeza, me sentía fatigado,
sólo quería dormir,
quería morir.
Mi traje estaba
empapado de sangre
y entre mis dedos se
veían algunos cabellos
– los cabellos de mi
pobre madre –.
“Por qué maltratas a
tu madre” me preguntaba entonces una piedra,
una piedra cubierta
de polvo, “por qué la maltratas”.
Yo no sabía de dónde
venían esas voces que me hacían temblar;
me miraba las uñas y
me las mordía,
trataba de pensar
infructuosamente en algo
pero sólo veía en
torno a mí un desierto
y veía la imagen de
ese ídolo
mi dios que me miraba
hacer estas cosas.
Aparecieron entonces
unos pájaros
y al mismo tiempo en
la obscuridad descubrí unas rocas.
En un supremo
esfuerzo logré distinguir las tablas de la ley:
“Nosotras somos las
tablas de la ley”, decían ellas.
“Por qué maltratas a
tu madre”
“Ves esos pájaros que
se han venido a posar sobre nosotras”
“Ahí están ellos para
registrar tus crímenes.”
Pero yo bostezaba, me
aburría de estas admoniciones.
“Espanten esos
pájaros”, dije en voz alta.
“No”, respondió una
piedra,
“ellos representan
tus diferentes pecados.”
“Ellos están ahí para
mirarte.”
Entonces yo me volví
de nuevo a mi dama
y le empecé a dar más
firme que antes.
Para mantenerse
despierto había que hacer algo,
estaba en la
obligación de actuar
so pena de caer
dormido entre aquellas rocas,
aquellos pájaros.
Saqué entonces una
caja de fósforos de uno de mis bolsillos
y decidí quemar el
busto del dios;
tenía un frío
espantoso, necesitaba calentarme,
pero este fuego sólo
duró algunos segundos.
Desesperado busqué de
nuevo las tablas
pero ellas habían
desaparecido:
las rocas tampoco
estaban allí.
Mi madre me había
abandonado.
Me toqué la frente;
pero no:
ya no podía más.
De: “Poemas y antipoemas” (1954)
Endymion Adormecido
(Nicolas Guy Brenet:
pintor francês)
As Tábuas
Sonhei que me
encontrava num deserto e que enfarado de mim mesmo
começava a bater numa
mulher.
Era um frio dos
demônios; era necessário fazer algo,
fazer fogo, fazer um
pouco de exercício;
porém, doía-me a
cabeça, sentia-me fatigado,
só queria dormir,
queria morrer.
Minha roupa estava
empapada de sangue
e entre os meus dedos
viam-se alguns cabelos
– os cabelos de minha
pobre mãe –.
“Por que maltratas a
tua mãe” me perguntava uma pedra,
uma pedra coberta de
pó, “por que me maltratas”.
Eu não sabia de onde
vinham estas vozes que me faziam estremecer;
olhava as unhas e as
mordia,
tratava de pensar
infrutuosamente em algo
porém só via em torno
de mim um deserto
e via a imagem desse
ídolo
meu deus que me
olhava fazendo estas coisas.
Apareceram então uns
pássaros
e ao mesmo tempo na
escuridão descobri algumas rochas.
Num supremo esforço
ousei distinguir as tábuas da lei:
“Nós somos as tábuas
da lei”, diziam elas.
“Por que maltratas a
tua mãe”
“Vês esses pássaros
que vieram pousar sobre nós”
“Aí estão eles para
registrar teus crimes.”
Porém, eu bocejava,
aborreciam-me estas admoestações.
“Espantem esses
pássaros”, disse em voz alta.
“Não”, respondeu uma
pedra,
“eles representam
teus diferentes pecados.”
“Eles estão aqui para
olhar-te.”
Então me voltei de
novo para minha dama
e comecei-lhe a bater
mais firme do que antes.
Para manter-me
desperto havia que fazer algo,
estava na obrigação
de agir
sob pena de cair
adormecido entre aquelas rochas,
aqueles pássaros.
Arranquei então uma
caixa de fósforos de um dos meus bolsos
e decidi queimar o
busto do deus;
tinha um frio
espantoso, necessitava aquecer-me,
porém este fogo só
durou alguns segundos.
Desesperado busquei
de novo as tábuas
mas elas haviam
desaparecido:
as rochas tampouco
estavam ali.
Minha mãe me
abandonara.
Toquei a minha
fronte; porém não:
já não podia mais.
Referência:
PARRA, Nicanor. Las tablas / As tábuas. Tradução de Carlos Nejar. In: NEJAR, Carlos; FERNÁNDEZ, Maximino (Tradução e Introdução / Traducción y introducción). Nicanor Parra e Vinicius de Moraes / Nicanor Parra y
Vinicius de Moraes. Rio de Janeiro, RJ: Academia Brasileira de Letras; Academia Chilena
de la Lengua, 2009. Em espanhol: p. 136 e 138; em português: p. 137 e 139.
Disponível neste
endereço. Acesso em: 23 jul. 2016.
❁
Nenhum comentário:
Postar um comentário