Extraído do seu “Libro de Poemas”, de 1921, o carme desta postagem foi
redigido no dia 8 de fevereiro de 1920, quando Lorca estava para completar 22
anos e, imagino, ainda pouco pacificado se encontrava em espírito.
Suponho que, tal como aconteceu comigo quando o li pela primeira vez, a
maioria das pessoas o associaria, de pronto, à letra da canção “Alma”, de Sueli
Costa e Abel Silva, um dos sucessos do álbum “Corpo e Alma”, de 1982, da
cantora Simone – muito embora, é óbvio, haja claras distinções entre o conteúdo
bem mais intricado de Lorca e a composição de acesso imediato da dupla
brasileira.
J.A.R. – H.C.
Federico García Lorca
(1898-1936)
Hay almas que tienen...
Hay almas que tienen
azules luceros,
mañanas marchitas
entre hojas del
tiempo,
y castos rincones
que guardan un viejo
rumor de nostalgias
y sueños.
Otras almas tienen
dolientes espectros
de pasiones. Frutas
con gusanos. Ecos
de una voz quemada
que viene de lejos
como una corriente
de sombra. Recuerdos
vacíos de llanto
y migajas de besos.
Mi alma está madura
hace mucho tiempo,
y se desmorona
turbia de misterio.
Piedras juveniles
roídas de ensueño
caen sobre las aguas
de mis pensamientos.
Cada piedra dice:
“¡Dios está muy
lejos!”
Corpo e Alma
(Gerald Ivey: pintor
norte-americano)
Há almas que têm...
Há almas que têm
azuis luzeiros,
manhãs murchas
entre folhas do
tempo,
e castos rincões
que guardam um velho
rumor de nostalgias
e sonhos.
Outras almas têm
dolentes espectros
de paixões. Frutas
com bichos. Ecos
de uma voz queimada
que vem de longe
como uma corrente
de sombra.
Recordações
vazias de pranto
e migalhas de beijos.
Minh’alma está madura
faz muito tempo,
e se desmorona
turva de mistério.
Pedras juvenis
roídas de sonho
caem sobre as águas
de meus pensamentos.
Cada pedra diz:
“Deus está muito longe!”
Alma
(Simone)
Alma
(Sueli Costa e Abel
Silva)
Há almas que têm
As dores secretas,
As portas abertas
Sempre pra dor.
Há almas que têm
Juízo e vontades,
Alguma bondade
E algum amor.
Há almas que têm
Espaços vazios,
Amores vadios,
Restos de emoção.
Há almas que têm
A mais louca alegria,
Que é quase agonia,
Quase profissão.
A minha alma tem
Um corpo moreno,
Nem sempre sereno,
Nem sempre explosão.
Feliz esta alma
Que vive comigo,
Que vai onde eu sigo
O meu coração.
Referência:
LORCA, Federico García. Hay almas que
tienen... / Há almas que tem... Tradução de William Agel de Melo. In: __________. Obra poética completa. Tradução de William Agel de Melo. Edição bilíngue. Brasília, DF: Ed. da UnB; São Paulo, SP:
Livraria Martins Fontes Editora Ltda., 1989. Em espanhol: p. 100 e 102; em português:
p. 101 e 103.
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Olá! Sabia que este poema foi musicado recentemente por Felipe Radicetti e compõe seu belíssimo CD Lorca, lançado em 2021? https://g.co/kgs/jWpX6i
ResponderExcluirBoa tarde, Romis:
ExcluirMuito bom saber! Julgo bastante interessante quando se superpõem experiências estéticas de distintas artes, a exemplo da poesia com a música, obtendo-se um claro ganho sinérgico – a exemplo do das reportadas gravações.
Grato demais pela notícia e pelo comentário.
Um abraço,
João A. Rodrigues