O poeta descreve os extremos em que vive, com aquele seu estilo
inconfundível, elegante e intrincado, de tal modo retórico, que os dilemas sob
os quais está imerso aí encontram fluxo tormentoso, levando-o à exaustão só
para, logo além, retornarem cada vez mais candentes.
É um sofrimento que o faz migrar de um pólo a outro, de modo a revelar
um espírito sem repouso, incapaz de comprazer-se no meramente ser e estar de
cada momento, e daí extrair um flagrante de serenidade...
J.A.R. – H.C.
Luís Vaz de Camões
(1524-1580)
Coitado! Que em um tempo choro e rio
Coitado! Que em um
tempo choro e rio;
Espero e temo, quero
e aborreço;
Juntamente me alegro
e entristeço;
Confio de uma causa e
desconfio;
Voo sem asas; estou
cego e guio;
Alcanço menos no que
mais mereço;
Então falo melhor,
quando emudeço;
Sem ter contradição
sempre porfio;
Possível se me faz
todo o impossível;
Intento, com
mudar-me, estar-me quedo;
Usar de liberdade e
ser cativo;
Queria visto ser, ser
invisível;
Ver-me desenredado,
amando o enredo;
Tais os extremos são
com que hoje vivo!
Referência:
CAMÕES, Luiz Vaz de. Coitado! Que em um
tempo choro e rio. In: __________. Camões:
200 sonetos. Porto Alegre, RS: L&PM, 2010. p. 31. (Coleção ‘L&PM
Pocket’; Vol. 109)
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