Augusto de Campos, com o seu inigualável talento para selecionar e
traduzir poemas, verteu ao português este excerto introdutório do Livro I de ‘Endymion’,
do poeta romântico inglês John Keats, baseado no homônimo mito grego do pastor
que caiu nas graças da deusa da lua Selene.
O poema aborda o poder da natureza para, com suas maravilhas,
hipnotizar-nos e suprimir, volta e meia, toda a tristeza que, porventura, venha a nos assolar. Nele, distintamente da história original, segundo a qual Selene
visita o adormecido Endymion todas as noites, é Endymion que expressa a sua
afeição por Diana.
J.A.R. – H.C.
John Keats
(1795-1821)
From ‘Endymion’
A thing of beauty is a joy for ever:
Its loveliness increases; it will never
Pass into nothingness; but still will keep
A bower quiet for us, and a sleep
Full of sweet dreams, and health, and quiet
breathing.
Therefore, on every morrow, are we wreathing
A flowery band to bind us to the earth,
Spite of despondence, of the inhuman dearth
Of noble natures, of the gloomy days,
Of all the unhealthy and o’er-darkened ways
Made for our searching: yes, in spite of all,
Some shape of beauty moves away the pall
From our dark spirits. Such the sun, the moon,
Trees old and young, sprouting a shady boon
For simple sheep; and such are daffodils
With the green world they live in; and clear rills
That for themselves a cooling covert make
’Gainst the hot season; the mid forest brake,
Rich with a sprinkling of fair musk-rose blooms:
And such too is the grandeur of the dooms
We have imagined for the mighty dead;
All lovely tales that we have heard or read:
An endless fountain of immortal drink,
Pouring unto us from the heaven’s brink.
Endymion e Selene
(Filippo Lauri:
pintor italiano)
Do ‘Endymion’
O que é belo há de
ser eternamente
Uma alegria, e há de
seguir presente.
Não morre; onde quer
que a vida breve
Nos leve, há de nos
dar um sono leve,
Cheio de sonhos e de
calmo alento.
Assim, cabe tecer
cada momento
Nessa grinalda que
nos entretece
À terra, apesar da
pouca messe
De nobres naturezas,
das agruras,
Das nossas tristes
aflições escuras,
Das duras dores. Sim,
ainda que rara,
Alguma forma de
beleza aclara
As névoas da alma. O
sol e a lua estão
Luzindo e há sempre
uma árvore onde vão
Sombrear-se as
ovelhas; cravos, cachos
De uvas num mundo
verde; riachos
Que refrescam, e o
bálsamo da aragem
Que ameniza o calor;
musgo, folhagem,
Campos, aromas,
flores, grãos, sementes,
E a grandeza do fim
que aos imponentes
Mortos pensamos
recobrir de glória,
E os contos
encantados na memória:
Fonte sem fim dessa
imortal bebida
Que vem dos céus e
alenta a nossa vida.
Referência:
KEATS, John. From ‘Endymion’ / Do ‘Endymion’. Tradução de Augusto
de Campos. In: CAMPOS, Augusto de. Byron
e Keats: entreversos. Edição bilíngue. Traduções de Augusto de Campos.
Campinas, SP: Editora da Unicamp, 2009. Em inglês: p. 168; em português: 169.
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