Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

domingo, 1 de maio de 2016

Vicente de Carvalho - A Flor e a Fonte

Neste mais que reprisado poema, o poeta e magistrado paulista metaforiza, nas figuras da flor e da fonte, o declínio dos poderes mágicos do amor, e mais extensivamente, do fluxo de todas as coisas que configuram uma vida plena.

Singelo, mas nem por isso menos belo, o poema nos faz refletir sobre o sentido último de nossas vidas, quase sempre gozadas num cotidiano atribulado e que deixa pouca margem para os prazeres da contemplação e da meditação, com o que poderíamos encontrar um estado de equilíbrio e serenidade.

J.A.R. – H.C.

Vicente de Carvalho
(1866-1924)

A Flor e a Fonte

“Deixa-me, fonte!” Dizia
A flor, tonta de terror.
E a fonte, sonora e fria,
Cantava, levando a flor.

“Deixa-me, deixa-me, fonte!”
Dizia a flor a chorar:
“Eu fui nascida no monte...
Não me leves para o mar.”

E a fonte, rápida e fria,
Com um sussurro zombador,
Por sobre a areia corria,
Corria levando a flor.

“Ai, balanços do meu galho,
Balanços do berço meu;
Ai, claras gotas de orvalho
Caídas do azul do céu!...”

Chorava a flor, e gemia,
Branca, branca de terror,
E a fonte sonora e fria,
Rolava, levando a flor.

“Adeus, sombra das ramadas,
Cantigas do rouxinol;
Ai, festa das madrugadas,
Doçuras do pôr do sol;

Carícia das brisas leves
Que abrem rasgões de luar...
Fonte, fonte, não me leves,
Não me leves para o mar!...”

As correntezas da vida
E os restos do meu amor
Resvalam numa descida
Como a da fonte e da flor.

Lírios D’Água
(Claude Monet: pintor francês)

Referência:

CARVALHO, Vicente. A flor e a fonte. In: __________. Rosa, rosa de amor: poema. Rio de Janeiro, RJ: Laemmert & C. Editores, 1902. p. 31-32.

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