Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

segunda-feira, 9 de maio de 2016

Alberto de Oliveira - Canção de Ariel

Alberto de Oliveira é o pseudônimo do carioca Antônio Mariano de Oliveira, um dos clássicos do parnasianismo brasileiro, juntamente com Olavo Bilac e Raimundo Correa.

Neste poema, o poeta coloca as suas palavras na boca de Ariel, um personagem que, na comédia mágica “A Tempestade”, de William Shakespeare, representa um espírito libertado por um selvagem que havia sido encerrado por sua mãe, uma bruxa, no oco de uma árvore.

Ariel serve, mesmo que algo contrariado por sua falta de liberdade, aos apelos de vingança do duque de Milão, escorraçado ilegitimamente do poder pelo próprio irmão. Tem-se de fato, então, uma história de usurpação de poder por quem não de direito, tal como em Hamlet: qualquer similaridade com o que anda a acontecer num certo país da América do Sul, neste momento, não será mera coincidência! (rs).

Mas Ariel, no poema de Oliveira, já é um espírito mais vocacionado às rogativas do amor: a canção que entoa embala o sono de Emma, não exatamente personagem da supracitada peça do bardo, senão talvez o objeto de afeto do próprio poeta. Aliás, “Canção de Ariel” pertence à sua obra “Livro de Emma: 1892-1897”.

J.A.R. – H.C.

Alberto de Oliveira
(1857-1937)

Canção de Ariel

Em nuvem leve, ainda mais leve
Que o fugitivo floco
De espuma ou neve,
Passa Ariel a cantar: – “Gênios, eu vos invoco!
Vinde do bosque ou das colinas,
Com festões ou grinaldas
De alvas boninas;
Deixai do alpestre monte as verdejantes faldas
E as vertentes silenciosas!
Os vossos instrumentos,
– Almas maviosas,
Liras e harpas trazei, gênios que errais aos ventos!

A ilha ideal que se recame
Toda de rosas! Eia,
Pistilo e estame
Deixai, abelhas de ouro, e de canções enchei-a!
Vinde, libélulas de prata,
Que ides banhar-vos lestas
Lá na cascata,
E sais a bailar por campos e florestas!
Vinde, vós todos, e cercai-a,
A bela, que a cabeça
Pende e desmaia;
Vinde! é a voz afinar e uma canção depressa!

Vinde! e do sono entre os vapores,
Como pela espessura
A alma das flores,
Divague a alma gentil que esta solidão procura.
Vinde! Porém, que vos não veja
Aquele gênio alado
Que leve adeja
E às vezes passa aqui com a aljava de ouro ao lado!
Que vos não veja e vos não siga
Ele, que á fina e clara
Mão inimiga
O arco tem sempre e é morte a flecha que dispara.

Guardai-a bem, ficai-me a postos,
Gênios! E arda a alegria
Nos vossos rostos,
E um bailado dançai, antes que rompa o dia!”
Emma, assim, no ar ouvindo
Este canto, adormece,
Entressorrindo
E sonhando, à manhã que pálida aparece;
Assim, a lira de ouro e neve
Presa do leve braço,
Em nuvem leve
Passa Ariel a cantar, embalado no espaço.

Ariel
(Johann Heinrich Füssli: pintor suíço)

Referência:

OLIVEIRA, Alberto de. Canção de Ariel. In: __________. Poesias: 1892-1903. 2. Série. Rio de Janeiro: Livraria Garnier, 1912. p. 24-25.

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