Alberto de Oliveira é o pseudônimo do carioca Antônio Mariano de
Oliveira, um dos clássicos do parnasianismo brasileiro, juntamente com Olavo
Bilac e Raimundo Correa.
Neste poema, o poeta coloca as suas palavras na boca de Ariel, um
personagem que, na comédia mágica “A Tempestade”, de William Shakespeare, representa
um espírito libertado por um selvagem que havia sido encerrado por sua mãe, uma
bruxa, no oco de uma árvore.
Ariel serve, mesmo que algo contrariado por sua falta de liberdade, aos
apelos de vingança do duque de Milão, escorraçado ilegitimamente do poder pelo
próprio irmão. Tem-se de fato, então, uma história de usurpação de poder por
quem não de direito, tal como em Hamlet: qualquer similaridade com o que anda a
acontecer num certo país da América do Sul, neste momento, não será mera
coincidência! (rs).
Mas Ariel, no poema de Oliveira, já é um espírito mais vocacionado às rogativas
do amor: a canção que entoa embala o sono de Emma, não exatamente personagem
da supracitada peça do bardo, senão talvez o objeto de afeto do próprio poeta.
Aliás, “Canção de Ariel” pertence à sua obra “Livro de Emma: 1892-1897”.
J.A.R. – H.C.
Alberto de Oliveira
(1857-1937)
Canção de Ariel
Em nuvem leve, ainda
mais leve
Que o fugitivo floco
De espuma ou neve,
Passa Ariel a cantar:
– “Gênios, eu vos invoco!
Vinde do bosque ou
das colinas,
Com festões ou
grinaldas
De alvas boninas;
Deixai do alpestre
monte as verdejantes faldas
E as vertentes
silenciosas!
Os vossos
instrumentos,
– Almas maviosas,
Liras e harpas
trazei, gênios que errais aos ventos!
A ilha ideal que se
recame
Toda de rosas! Eia,
Pistilo e estame
Deixai, abelhas de
ouro, e de canções enchei-a!
Vinde, libélulas de prata,
Que ides banhar-vos
lestas
Lá na cascata,
E sais a bailar por
campos e florestas!
Vinde, vós todos, e
cercai-a,
A bela, que a cabeça
Pende e desmaia;
Vinde! é a voz afinar
e uma canção depressa!
Vinde! e do sono
entre os vapores,
Como pela espessura
A alma das flores,
Divague a alma gentil
que esta solidão procura.
Vinde! Porém, que vos
não veja
Aquele gênio alado
Que leve adeja
E às vezes passa aqui
com a aljava de ouro ao lado!
Que vos não veja e
vos não siga
Ele, que á fina e
clara
Mão inimiga
O arco tem sempre e é
morte a flecha que dispara.
Guardai-a bem, ficai-me
a postos,
Gênios! E arda a
alegria
Nos vossos rostos,
E um bailado dançai,
antes que rompa o dia!”
Emma, assim, no ar
ouvindo
Este canto, adormece,
Entressorrindo
E sonhando, à manhã que
pálida aparece;
Assim, a lira de ouro
e neve
Presa do leve braço,
Em nuvem leve
Passa Ariel a cantar,
embalado no espaço.
Ariel
(Johann Heinrich Füssli: pintor suíço)
Referência:
OLIVEIRA, Alberto de. Canção de Ariel.
In: __________. Poesias: 1892-1903.
2. Série. Rio de Janeiro: Livraria Garnier, 1912. p. 24-25.
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