É bastante provável que o poema abaixo transcrito, redigido em 1857, a
falar de uma flor debruçada nas águas de um regato, tenha servido de inspiração
para o poema, que revela muitos elementos congêneres, intitulado “A Flor e a Fonte” (1902),
do paulista Vicente de Carvalho.
A metáfora em relação às pessoas apegadas às coisas do mundo parece-me, à primeira vista, suficientemente clara. Outra hipótese plausível diz respeito à luta por um
sentimento amoroso aguçado por experiências anteriores infelizes.
J.A.R. – H.C.
Gonçalves Dias
(1823-1864)
Não me deixes!
Debruçada nas águas
dum regato
A flor dizia em vão
À corrente, onde bela
se mirava...
“Ai, não me deixes,
não!”
“Comigo fica ou
leva-me contigo
Dos mares à amplidão;
Límpido ou turvo, te
amarei constante;
Mas não me deixes,
não!”
E a corrente passava;
novas águas
Após as outras vão;
E a flor sempre a
dizer curva na fonte:
“Ai, não me deixes,
não!”
E das águas que fogem
incessantes
À eterna sucessão
Dizia sempre a flor,
e sempre embalde:
“Ai, não me deixes,
não!”
Por fim desfalecida e
a cor murchada,
Quase a lamber o
chão,
Buscava inda a
corrente por dizer-lhe
Que a não deixasse,
não.
A corrente impiedosa
a flor enleia,
Leva-a do seu torrão;
A afundar-se dizia a
pobrezinha:
“Não me deixaste, não!”
Belas Flores
(Bob Ross: pintor
norte-americano)
Referência:
DIAS, Gonçalves. Não me deixes! In: MILLIET,
Sérgio (Seleção e notas). Obras-primas
da poesia universal. 3. ed. São Paulo, SP: Livraria Martins Editora, 1957.
p. 92-93.
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