É como se estivéssemos na África, numa savana tropical, e
presenciássemos a passagem de uma manada de elefantes à nossa frente: ratificaríamos,
então, a sua imponência física, seus costumes e instintos.
São criaturas inteligentes que parecem deslocar-se para além de uma
simples migração, senão que envoltos numa peregrinação, aparecendo e desaparecendo
enigmática e dignamente. Eis aí um representante do poderio animal, com raros predadores, como o próprio homem e, ocasionalmente, o leão.
J.A.R. – H.C.
Charles Marie René
Leconte de Lisle nasceu em 1818. Em 1852 publicou, sob o título de “Poemas
Antigos”, o seu primeiro livro, embora já algumas composições tivessem
aparecido em revistas. Suas obras poéticas, tais como ele próprio as distribuiu
numa edição definitiva, compõem-se de três volumes: “Poemas Antigos”; “Poemas
Bárbaros” (1862) e “Poemas Trágicos” (1884). Há ainda uma coleção póstuma intitulada:
“Últimos Poemas” (1895). Escreveu, também, para o teatro “Les Erinnyes” e “L’Appolonide”.
Pertenceu à Academia francesa, para a qual foi eleito em 1886 na vaga de Victor
Hugo. Morreu em 1894 (MILLIET, 1957, p. 78).
Leconte de Lisle
(1818-1894)
Les Éléphants
Le sable rouge est
comme une mer sans limite,
Et qui flambe,
muette, affaissée en son lit.
Une ondulation immobile remplit
L’horizon aux vapeurs de cuivre où l’homme habite.
Nulle vie et nul bruit. Tous les lions repus
Dorment au fond de l’antre éloigné de cent lieues,
Et la girafe boit dans les fontaines bleues,
Là-bas, sous les dattiers des panthères connus.
Pas un oiseau ne passe en fouettant de son aile
L’air épais, où
circule un immense soleil.
Parfois quelque boa,
chauffé dans son sommeil,
Fait onduler son dos dont l’écaille étincelle.
Tel l’espace enflammé brûle sous les cieux clairs.
Mais, tandis que tout dort aux mornes solitudes,
Lés éléphants rugueux, voyageurs lents et rudes
Vont au pays natal à
travers les déserts.
D’un point de l’horizon, comme des masses brunes,
Ils viennent, soulevant la poussière, et l’on voit,
Pour ne point dévier du chemin le plus droit,
Sous leur pied large et sûr crouler au loin les
dunes.
Celui qui tient la tête est un vieux chef. Son
corps
Est gercé comme un tronc que le temps ronge et mine
Sa tête est comme un roc, et l’arc de son échine
Se voûte puissamment à ses moindres efforts.
Sans ralentir jamais et sans hâter sa marche,
Il guide au but certain ses compagnons poudreux;
Et, creusant par derrière un sillon sablonneux,
Les pèlerins massifs suivent leur patriarche.
L’oreille en
éventail, la trompe entre les dents,
Ils cheminent, l’oeil clos. Leur ventre bat et
fume,
Et leur sueur dans l’air embrasé monte en brume;
Et bourdonnent autour mille insectes ardents.
Mais qu’importent la
soif et la mouche vorace,
Et le soleil cuisant
leur dos noir et plissé?
Ils rêvent en marchant du pays délaissé,
Des forêts de figuiers où s’abrita leur race.
Ils reverront le fleuve échappé des grands monts,
Où nage en mugissant l’hippopotame énorme,
Où, blanchis par la Lune et projetant leur forme,
Ils descendaient pour boire en écrasant les joncs.
Aussi, pleins de
courage et de lenteur, ils passent
Comme une ligne noire, au sable illimité;
Et le désert reprend son immobilité
Quand les lourds
voyageurs à l’horizon s’effacent.
(Dans: “Poèmes Barbares”, 1862)
Elefante Sedento
(Heila van der Merwe:
pintora sul-africana)
Os Elefantes
Mar sem limite – o
areal vermelho abrasa e estua
Em seu leito onde o
sol raios de ouro espadana.
Ondula, em fumos no
ar, sobre a planície nua,
O amplo horizonte
onde fervilha a vida humana.
Nenhum rumor. Somente
os leões dormem saciados,
Cem léguas em redor,
no antro absconso das feras.
Bebe a girafa a água
dos veios azulados
Sob as palmeiras –
doce asilo das panteras.
Nem um pássaro, um
só, num voo de abandono,
Corta com o alfanje
da asa o infinito que escalda.
Por vezes a serpente,
acordada em seu sono,
Move as escamas
lampejantes de esmeralda.
E enquanto o espaço
abafa em mormaços violentos
E em tudo pesa a
lassidão de um sono incerto,
Os Elefantes vão,
rudes viajeiros lentos,
Rumo ao país natal,
através do deserto...
De um ponto do
horizonte, entre nuvens de poeira,
Mexem-se com vagar,
tardos e desconformes...
E em linha regular, –
soldados em fileira –
Dunas levam rolando
entre as patas enormes.
À frente marcha o
velho chefe. Tem o dorso
Áspero. É um tronco
exposto ao tempo que o espezinha.
A cabeça é uma rocha;
e, num mínimo esforço,
Dobra, crespo e
brutal, o arco mole da espinha.
Conservando na marcha
um ritmado compasso,
Ele indica o país que
o Destino lhes marca...
E, abrindo a areia,
os peregrinos, passo a passo,
Seguem passivamente o
velho patriarca...
A orelha em leque, a
tromba a rolar entre dentes,
Caminham sempre... Os
ventres negros lhe latejam;
No ar abrasado o suor
sobe, em volutas quentes,
Enquanto, em
derredor, milhões de insetos voejam...
Que lhes importa a
sede e a inclemência maldita
Do sol de brasas? E o
moscardo que os ameaça?
Se eles sonham com a
terra encantada onde habita
Entre figueiras,
longe, a sua heroica raça?
Verão, a cascatear de
altos montes incultos,
O rio em que rolava o
hipopótamo a fio...
Onde, em noites de
luar, vinham mirando os vultos
N’água, em torno aos
juncais, beber a água do rio.
É por todo esse ideal
que os enche de saudade,
Que eles cortam o
areal longínquo que se explana...
E o deserto retoma a
ampla imobilidade
Quando, ao longe, se
perde a lenta caravana...
(Em: “Poemas Bárbaros”, 1862)
Referências:
Em Francês
LISLE, Leconte de. Les éléphants.
LISLE, Leconte de et al. Anthologie des
poètes français du XIXème Siècle: 1818-1841. Tome 2. Paris, FR: Alphonse
Lemerre Éditeur, 1888. p. 18-20.
Em Português
LISLE, Leconte de. Os elefantes.
Tradução de Olegário Marianno. In: MARIANNO, Olegário (Org.). Traduções selecionadas: antologia de
tradutores. Rio de Janeiro, GB: Guanabara Waissman Koogan Ltda., 1932.
p. 113-116.
MILLIET, Sérgio (Seleção e notas). Obras-primas da poesia universal. 3.
ed. São Paulo, SP: Livraria Martins Editora, 1957.
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