Quasimodo, poeta italiano, emprega um tom propositadamente mórbido e
deprimente no poema abaixo, tanto quanto o foi o campo de concentração nazista,
ali onde pairam cinzas enquanto “medalha do silêncio”.
Apesar de tudo, vê-se que o poeta mantém a esperança de que a morte não
suplante em nenhum momento a vontade de viver, tanto mais se ela decorre do
vilipêndio a direitos e da desconsideração à dignidade da pessoa humana.
J.A.R. – H.C.
Salvatore Quasimodo
(1901-1968)
Auschwitz
Laggiù, ad Auschwitz, lontano dalla Vistola,
amore, lungo la
pianura nordica,
in un campo di morte:
fredda, funebre,
la pioggia sulla
ruggine dei pali
e i grovigli di ferro
dei recinti:
e non albero o
uccelli nell’aria grigia
o su dal nostro
pensiero, ma inerzia
e dolore che la
memoria lascia
al suo silenzio senza
ironia o ira.
Tu non vuoi elegie,
idilli: solo
ragioni della nostra
sorte, qui,
tu, tenera ai
contrasti della mente,
incerta a una
presenza
chiara della vita. E
la vita è qui,
in ogni no che pare
una certezza:
qui udremo piangere
l’angelo il mostro
le nostre ore future
battere l’al di là, che è qui, in eterno
e in movimento, non in un’immagine
di sogni, di
possibile pietà.
E qui le metamorfosi,
qui i miti.
Senza nome di simboli
o d’un dio,
sono cronaca, luoghi
della terra,
sono Auschwitz,
amore. Come subito
si mutò in fumo
d’ombra
il caro corpo d’Alfeo
e d’Aretusa!
Da quell’inferno aperto
da una scritta
bianca: “Il
lavoro vi renderà liberi ”
uscì continuo il fumo
di migliaia di donne
spinte fuori
all’alba dai canili
contro il muro
del tiro a segno o
soffocate urlando
misericordia
all’acqua con la bocca
di scheletro sotto le
docce a gas.
Le troverai tu,
soldato, nella tua
storia in forme di fiumi, d’animali,
o sei tu pure cenere
d’Auschwitz,
medaglia di silenzio?
Restano lunghe trecce
chiuse in urne
di vetro ancora
strette da amuleti
e ombre infinite di
piccole scarpe
e di sciarpe d’ebrei:
sono reliquie
d’un tempo di
saggezza, di sapienza
dell’uomo che si fa
misura d’armi,
sono i miti, le
nostre metamorfosi.
Sulle distese dove
amore e pianto
marcirono e pietà,
sotto la pioggia,
laggiù, batteva un no
dentro di noi,
un no alla morte,
morta ad Auschwitz,
per non ripetere, da
quella buca
di cenere, la morte.
Da: “Il falso e vero verde” (1954)
Auschwitz
Oswiecim - Polônia
Auschwitz
Lá longe, em Auschwitz, distante do Vístula
querida, pela
planície nórdica,
em um campo de morte:
fria, fúnebre,
a chuva sobre a
ferrugem dos postes
e sobre os nós de
ferro dos recintos:
e nem uma árvore ou
pássaros no ar gris
ou em nossos
pensamentos, apenas inércia
e dor, que a memória
deixa
ao seu silêncio sem
ironia ou ira.
Tu não queres
elegias, cânticos: somente
razões da nossa
sorte, aqui,
tu, suave nos
contrastes do espírito,
incerta a uma
presença
clara da vida. E a
vida está aqui,
em cada não que
semelha uma certeza:
aqui ouviremos chorar
o anjo, o monstro,
e nossas horas
futuras
soar o além, que está
aqui, em eternidade
e em movimento, não
na imagem
de sonhos, de
possível piedade.
E aqui as
metamorfoses, aqui os mitos.
Sem nome de símbolos
ou de um deus,
eles são a crônica,
os lugares da terra,
são Auschwitz, querida. Como instantânea
em fumaça de sombra,
se fez
o caro corpo de Alfeu
e de Aretusa!
Daquele inferno
aberto por uma escrita
branca: “O trabalho
vos fará livres”
saiu contínuo o fumo
de milhares de
mulheres, atiradas à alva
fora dos canis contra
o muro
do tiro ao alvo ou
sufocadas urrando
misericórdia à água
com a boca
esquelética sob as
duchas a gás.
Tu, soldado, as
encontrarás na tua
história, em forma de
rios, de animais,
ou és tu também
cinzas de Auschwitz,
medalha de silêncio?
Ficaram longas
trancas fechadas em urnas
de vidro, ainda
atadas com amuletos
e sombras infinitas
de pequenos sapatos
e de mantas de
hebreus: são relíquias
de um tempo de
sapiência, de ciência
do homem que se faz
medida de armas,
são os mitos, as
nossas metamorfoses.
Nas vastidões, onde
amor e pranto
e piedade apodreceram,
lá longe
sob a chuva, pulsava
um não dentro de nós;
um não à morte, morta
em Auschwitz,
para não repetir, daquele
ninho
de cinzas, a morte.
De: “O falso e o verdadeiro verde”
(1954)
Referências:
Em italiano
QUASIMODO, Salvatore. Auschwitz. In:
CAMPOS, Marco Antonio (Selección y traducción). Poetas italianos del siglo XX: Umberto Saba, Vincenzo Cardarelli,
Giuseppe Ungaretti y Salvatore Quasimodo. Notas biográficas y epílogo de
Stefano Strazzabosco. Edición bilingue. 1. ed. México, DF: Difusión Cultural
UNAM, 2004. p. 424 y 426. (Serie ‘El Puente’)
Em português
QUASIMODO, Salvatore. Auschwitz. In:
__________. Poesias escolhidas.
Tradução de Sílvio Castro. Rio de Janeiro, RJ: Opera Mundi, 1971. p. 175-177.
(Biblioteca dos Prêmios Nobel de Literatura patrocinada pela Academia Sueca e
pela Fundação Nobel; Prêmio de 1959: Salvatore Quasimodo, Itália)
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