Mesmo as palavras têm o seu limite de significação, em relação a todo o
espectro das emoções humanas, muitas das quais intraduzíveis em poemas ou
outras manifestações da linguagem.
É do que nos procura convencer a poetisa argentina Pizarnik, neste seu primoroso poema. Escrito com perspicácia e sensibilidade, os sulcos que aos poucos
ele firma na intelecção do leitor resulta exatamente no eterno questionamento
sobre a prescindibilidade ou não da poesia...
J.A.R. – H.C.
Alejandra Pizarnik
(1936-1972)
en nesta noche, en este mundo
I
en nesta noche en
este mundo
las palabras del
sueño de la infancia de la muerte
nunca es eso lo que
uno quiere decir
la lengua natal
castra
la lengua es un
órgano de conocimiento
del fracaso de todo
poema
castrado por su
propia lengua
que es el órgano de
la re-creación
del re-conocimiento
pero no el de la
resurrección
de algo a modo de
negación
de mi horizonte de
maldoror con su perro
y nada es promesa
entre lo decible
que equivale a mentir
(todo lo que se puede
decir es mentira)
el resto es silencio
sólo que el silencio
no existe
II
no
las palabras
no hacen el amor
hacen la ausencia
si digo agua ¿beberé?
si digo pan ¿comeré?
III
en esta noche en este
mundo
extraordinario
silencio el de esta noche
lo que pasa con el
alma es que no se ve
lo que pasa con la
mente es que no se ve
lo que pasa con el
espíritu es que no se ve
¿de dónde viene esta
conspiración de invisibilidades?
ninguna palabra es
visible
sombras
recintos viscosos
donde se oculta
la piedra de la
locura
corredores negros
los he recorrido
todos
¡oh quédate un poco
más entre nosotros!
mi persona está
herida
mi primera persona
del singular
escribo como quien
con un cuchillo alzado en la oscuridad
escribo como estoy
diciendo
la sinceridad
absoluta continuaría siendo
lo imposible
¡oh quédate un poco
más entre nosotros!
IV
los deterioros de las
palabras
deshabitando el
palacio del lenguaje
el conocimiento entre
la piernas
¿qué hiciste del don
del sexo?
oh mis muertos
me los comí me atraganté
no puedo más de no poder
más
palabras embozadas
todo se desliza
hacia la negra liquefacción
V
y el perro de
maldoror
en esta noche en este
mundo
donde todo es posible
salvo
el poema
VI
hablo en fácil hablo
en difícil
sabiendo que no se
trata de eso
siempre no se trata
de eso
oh ayúdame a escribir
el poema más prescindible
el que no sirva ni
para
ser inservible
ayúdame a escribir
palabras
en esta noche en este
mundo
8 de octubre 1971
Pão e Água
(Hall Groat II:
artista norte-americano)
nesta noite, neste mundo
A Martha Isabel Moia
I
nesta noite neste
mundo
as palavras do sonho
da infância da morte
nunca é isso que
alguém quer dizer
a língua natal castra
a língua é um órgão
de conhecimento
do fracasso de todo
poema
castrado por sua
própria língua
que é o órgão da
re-criação
do re-conhecimento
porém não o da ressurreição
de algo a modo de
negação
de meu horizonte de maldoror com seu cão
e nada é promessa
entre o dizível
que equivale a mentir
(tudo o que se pode
dizer é mentira)
o resto é silêncio
só que o silêncio não
existe
II
não
as palavras
não fazem o amor
fazem a ausência
se digo água, beberei?
se digo pão, comerei?
III
nesta noite neste
mundo
extraordinário
silêncio o desta noite
o que se passa com a
alma é o que não se vê
o que se passa com a
mente é o que não se vê
o que se passa com o
espírito é o que não se vê
de onde vem esta
conspiração de invisibilidades?
nenhuma palavra é
visível
sombras
recintos viscosos
onde se oculta
a pedra da loucura
corredores negros
os que tenho percorrido
todos
oh fica-te um pouco
mais entre nós!
minha pessoa está
ferida
minha primeira pessoa
do singular
escrevo como quem ergue
uma faca na escuridão
escrevo como estou
dizendo
a sinceridade
absoluta continuará sendo
o impossível
oh fica-te um pouco
mais entre nós!
IV
os desgastes das
palavras
desabitando o palácio
da linguagem
o conhecimento entre
as pernas
o que fizeste do dom
do sexo?
oh meus mortos
eu os comi e me
engasguei
não posso mais de não
poder mais
palavras obstruídas
tudo se desliza
até a negra
liquefação
V
e o cão de maldoror
nesta noite neste
mundo
onde tudo é possível
salvo
o poema
VI
falo no fácil falo no difícil
sabendo que não se
trata disso
sempre não se trata
disso
oh ajuda-me a
escrever o poema mais prescindível
o que não sirva nem para
ser inservível
ajuda-me a escrever
palavras
nesta noite neste
mundo
8 de outubro de 1971
Referência:
PIZARNIK, Alejandra. en esta noche, en
este mundo. In: BORDA, Juan Gustavo Cobo (Selección, prólogo y notas). Antología de la poesía hispanoamericana.
1. ed. México, DF: Fondo de Cultura Económica, 1985. p. 463-465. (Colección
“Tierra Firme”)
❁
Maravilhoso. Mais um admirador de Pizarnik de quem me aproximo. Ela foi mesmo FANTÁSTICA. Vida curta. talento infindável. Parabéns... Ah! Também sou de Brasília.
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