Autor cuja biografia aponta para a edição de um único livro de poesias, “Clepsidra”,
de 1920, Pessanha, apesar disso, é considerado, por muitos, como um dos
principais poetas do simbolismo lusitano e um precursor da poesia modernista em
seu país.
É notória na obra de Pessanha a influência de Verlaine, repleta de versos
formais e rimados, como os do exemplo abaixo, em combinação com imagens
robustas e sensoriais, de forma a evocar, parece-me, uma mente não exatamente
pacificada. Tudo porque seus poemas reverberam a pulsação vívida de seus
desejos, crenças e pesares.
J.A.R. – H.C.
Camilo Pessanha
(1867-1926)
Caminho (I)
Tenho sonhos cruéis;
n’alma doente
Sinto um vago receio
prematuro.
Vou a medo na aresta
do futuro,
Embebido em saudades
do presente...
Saudades desta dor
que em vão procuro
Do peito afugentar
bem rudemente,
Devendo, ao desmaiar
sobre o poente,
Cobrir-me o coração
dum véu escuro!...
Porque a dor, esta
falta d’harmonia,
Toda a luz
desgrenhada que alumia
As almas doidamente,
o céu d’agora,
Sem ela o coração é
quase nada:
Um sol onde expirasse
a madrugada,
Porque é só madrugada
quando chora.
Voo do Anoitecer
(Vladimir Kush:
pintor russo)
Referência:
PESSANHA, Camilo. Caminho (I). In:
__________. Clepsidra e outros poemas.
Lisboa, PT: Edições Ática, 1969. p. 163-164.
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