Do não muito conhecido poeta maranhense Sousândrade, temos aqui um poema
cujo tema diz respeito à rainha Isabel de Espanha, possivelmente Isabel
II, da Casa dos Borbóns (Bourbon em francês e Borbone em italiano), haja
vista que o poema é datado de 1868, mesmo ano em que a soberana foi deposta e
exilada para a França.
Faço ver que há, pelo menos, duas versões para o mesmo poema, sendo que
a abaixo postada, muito provavelmente, é a primeira, a qual, em edições
posteriores da obra do poeta, sofreu alterações em inúmeros versos, como se
pode constatar em suas “Obras Poéticas”, disponível neste endereço.
J.A.R. – H.C.
Isabel II de Espanha
(1830-1904)
(Xaver Winterhalter: pintor
alemão)
Isabel de Espanha
Tanto agitaram o
turíbulo, que
esborracharam as
ventas do ídolo –
Op. Liberal
Filha de reis
divinos! divina sobre a terra!
Onde Isabel –
princesa, rainha excelsa – onde erra?
Sombra do abismo –
imagem do anjo decaído,
Que ver não sofre um
trono e nele um rei erguido,
Que tira-lhe primeiro
o amor da humanidade,
E, pelo condão mágico
da doce liberdade
Que d’alma luz à
fronte, cinge-lhe d’ouro a coroa
E meio a rir o deixa –
misérrima bourboa!
Na mão esquerda
empunhas teu raio de Vulcano,
Na destra e mais
sinistra teu cetro de tirano;
Silvam-te as tranças,
presas serpentes de Medusa,
E creste-te inspirada
– foi-te do inferno a musa!
Passavas como um
astro por sobre a escuridão
Das frontes
prosternadas da augusta multidão,
E a púrpura colhendo,
que a não manchasse a blusa,
Não viste que dormia
de Deus esse vulcão!
Nos ares reinam os
ventos, as vagas no oceano,
Na terra a fronte
livre do povo soberano!
Quando arrebenta o
raio, ergueu-se a tempestade;
Ao povo quando geme,
tiraram a liberdade;
Do peito lhe
arrancaram, arca de grande herança,
Dos seus avôs a
glória, dos filhos a esperança:
Porém, triste,
sofrente, não ruge muitas vezes
Na dor, e longos anos
vai mugibundas reses.
Mandam-no emudecer os
tresloucados reis,
Ébrios d’incensos
vãos; a carta de suas leis
Rasgam-lhe à face
pura – que então muda de cor!
A vez primeira
encaram-se, o povo, que é senhor,
Co’os reis, que ele
elevara – símbolo em seus altares,
Da paz ao cidadão e
da virtude aos lares!
Encaram-se inimigos,
com a verde parasita
A selva, que lhe dera
amor, seiva e guarita.
“Quão pouco custa,
ai! flor do trono de Bourbon,
Ser nos destinos guia
de um povo nobre e bom!”
Dirás, atrás olhando,
figueira amaldiçoada
Do Deus que sobre a
terra disse, com a voz sagrada
Que as almas
incendeia – amor e liberdade –
O Deus irmão dos
homens, o raio da verdade,
E que olvidais,
escravos, esfinges misteriosas,
Postos da pátria ao
meio, como mortuárias lousas!
E quando, a Espanha
na alva de vívidos fulgores,
Vires que volta o
amor à pátria dos amores,
Que ao menos do
remorso corra-lhe livre o pranto
A quem sorrir não
soube da liberdade ao canto.
Católica rainha, do exílio
majestade,
Desfolha a rosa de ouro da fronte triste assim:
A benção tua estende,
na hora da saudade,
À bela Espanha, à Torre e ao denodado Prim!
(1868)
Fotografia da Rainha
Referência:
SOUSÂNDRADE. Isabel de Espanha. In: __________.
Impressos - Poesias diversas.
Primeiro Volume. São Luís (MA): Impresso por B. de Mattos, 1868. p. 181-183.
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