Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

domingo, 17 de abril de 2016

Sousândrade - Isabel de Espanha

Do não muito conhecido poeta maranhense Sousândrade, temos aqui um poema cujo tema diz respeito à rainha Isabel de Espanha, possivelmente Isabel II, da Casa dos Borbóns (Bourbon em francês e Borbone em italiano), haja vista que o poema é datado de 1868, mesmo ano em que a soberana foi deposta e exilada para a França.

Faço ver que há, pelo menos, duas versões para o mesmo poema, sendo que a abaixo postada, muito provavelmente, é a primeira, a qual, em edições posteriores da obra do poeta, sofreu alterações em inúmeros versos, como se pode constatar em suas “Obras Poéticas”, disponível neste endereço.

J.A.R. – H.C.

Isabel II de Espanha
(1830-1904)
(Xaver Winterhalter: pintor alemão)

Isabel de Espanha

Tanto agitaram o turíbulo, que
esborracharam as ventas do ídolo –
Op. Liberal

Filha de reis divinos! divina sobre a terra!
Onde Isabel – princesa, rainha excelsa – onde erra?
Sombra do abismo – imagem do anjo decaído,
Que ver não sofre um trono e nele um rei erguido,
Que tira-lhe primeiro o amor da humanidade,
E, pelo condão mágico da doce liberdade
Que d’alma luz à fronte, cinge-lhe d’ouro a coroa
E meio a rir o deixa – misérrima bourboa!

Na mão esquerda empunhas teu raio de Vulcano,
Na destra e mais sinistra teu cetro de tirano;
Silvam-te as tranças, presas serpentes de Medusa,
E creste-te inspirada – foi-te do inferno a musa!
Passavas como um astro por sobre a escuridão
Das frontes prosternadas da augusta multidão,
E a púrpura colhendo, que a não manchasse a blusa,
Não viste que dormia de Deus esse vulcão!

Nos ares reinam os ventos, as vagas no oceano,
Na terra a fronte livre do povo soberano!
Quando arrebenta o raio, ergueu-se a tempestade;
Ao povo quando geme, tiraram a liberdade;
Do peito lhe arrancaram, arca de grande herança,
Dos seus avôs a glória, dos filhos a esperança:
Porém, triste, sofrente, não ruge muitas vezes
Na dor, e longos anos vai mugibundas reses.

Mandam-no emudecer os tresloucados reis,
Ébrios d’incensos vãos; a carta de suas leis
Rasgam-lhe à face pura – que então muda de cor!
A vez primeira encaram-se, o povo, que é senhor,
Co’os reis, que ele elevara – símbolo em seus altares,
Da paz ao cidadão e da virtude aos lares!
Encaram-se inimigos, com a verde parasita
A selva, que lhe dera amor, seiva e guarita.

“Quão pouco custa, ai! flor do trono de Bourbon,
Ser nos destinos guia de um povo nobre e bom!”
Dirás, atrás olhando, figueira amaldiçoada
Do Deus que sobre a terra disse, com a voz sagrada
Que as almas incendeia – amor e liberdade –
O Deus irmão dos homens, o raio da verdade,
E que olvidais, escravos, esfinges misteriosas,
Postos da pátria ao meio, como mortuárias lousas!

E quando, a Espanha na alva de vívidos fulgores,
Vires que volta o amor à pátria dos amores,
Que ao menos do remorso corra-lhe livre o pranto
A quem sorrir não soube da liberdade ao canto.
Católica rainha, do exílio majestade,
Desfolha a rosa de ouro da fronte triste assim:
A benção tua estende, na hora da saudade,
À bela Espanha, à Torre e ao denodado Prim!

(1868)

Fotografia da Rainha

Referência:

SOUSÂNDRADE. Isabel de Espanha. In: __________. Impressos - Poesias diversas. Primeiro Volume. São Luís (MA): Impresso por B. de Mattos, 1868. p. 181-183.

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