Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quarta-feira, 13 de abril de 2016

José Martí - Sede de Beleza

Além de reputado líder e patriota cubano, José Marti foi um grande poeta, como ilustra o poema que ora trazemos para abrilhantar este espaço. Trata ele da “sede” de beleza que o assola, e, para tanto, menciona nomes que ficaram na história por estarem associados à experiência do belo: Cellini, Milo, Louvre, Fra Angelico, Hamlet, Otelo... e uma manceba índia que o encantou em Chichén.

Os versos de Martí são intricados, de modo a dificultar a tarefa do leitor em decifrar as ideias que neles estão assentes. São muitos os hipérbatos e, por isso, julgamos oportuno apresentar duas versões em português aos internautas: uma na mesma ordem em que as palavras se apresentam no original, e outra em que se busca fixar o fluxo mais franco e direto dos pensamentos, de modo a facilitar o preciso entendimento do poema.

J.A.R. – H.C.

José Martí
(1853-1895)

Sed de Belleza

Solo, estoy solo: viene el verso amigo,
Como el esposo diligente acude
De la erizada tórtola al reclamo.
Cual de los altos montes en deshielo
Por breñas y por valles en copiosos
Hilos las nieves desatadas bajan –
Así por mis entrañas oprimidas
Un balsámico amor y una avaricia
Celeste, de hermosura se derraman.
Tal desde el vasto azul, sobre la tierra,
Cual si de alma virgen la sombría
Humanidad sangrienta perfumasen,
Su luz benigna las estrellas vierten
¡Esposas del silencio! – y de las flores
Tal el aroma vago se levanta.

Dadme lo sumo y lo perfecto. Dadme
Un dibujo de Ángelo; una espada
Con puño de Cellini, más hermosa
Que las techumbres de marfil calado
Que se place en labrar Naturaleza.
El cráneo augusto dadme donde ardieron
El universo Hamlet y la furia
Tempestuosa del moro; la manceba
India que a orillas del ameno río
Que del viejo Chichén los muros baña
A la sombra de un plátano pomposo
Y sus propios cabellos, el esbelto
Cuerpo bruñido y nítido enjugaba.
Dadme mi cielo azul..., dadme la pura,
La inefable, la plácida, la eterna
Alma de mármol que al soberbio Louvre
Dio, cual su espuma y flor, Milo famosa.

(De: “Versos Libres”, 1913)

Perseu
(Benvenuto Cellini: escultor italiano)

Sede de Beleza

Só, estou só: vem o verso amigo,
Como o esposo diligente acode
Da eriçada rola ao reclamo.
Qual dos altos montes em degelo
Por selvas e por vales em copiosos
Fios as neves desatadas baixam –
Assim por minhas entranhas oprimidas
Um balsâmico amor e uma avidez
Celeste, de formosura se derramam.
Tal desde o vasto azul, sobre a terra,
Qual se de alma virgem a sombria
Humanidade sangrenta perfumassem,
Sua luz benigna as estrelas vertem
Esposas do silêncio! – e das flores
Tal o aroma vago se levanta.

Dá-me o sumo e o perfeito! Dá-me
Um desenho de Ângelo; uma espada
Com punho de Cellini, mais formosa
Que os tetos de marfim ornado com
Que se apraz em lavrar a Natureza.
O crânio augusto dá-me no qual arderam
O universo de Hamlet e a fúria
Tempestuosa do moro; a manceba
Índia que às margens do ameno rio
Que do velho Chichén os muros banha
À sombra de um plátano pomposo
E seus próprios cabelos, o esbelto
Corpo lustroso e limpo enxugava.
Dá-me meu céu azul..., dá-me a pura,
A inefável, a plácida, a eterna
Alma de mármore que ao soberbo Louvre
Deu, qual sua espuma e flor, Milo famosa.

(De: “Versos Livres”, 1913)

Vênus de Milo
(Escultura grega de autoria desconhecida)

Sede de Beleza

Só, estou só: vem o verso amigo,
Como o esposo diligente ele acode
Ao reclamo da eriçada rola.
Tal como as neves desatadas que,
Em degelo, baixam em copiosos fios
Dos altos montes por selvas e vales –
Assim, também, por minhas oprimidas
Entranhas, um amor balsâmico e uma
Avidez celeste se derramam de formosura.
As estrelas – esposas do silêncio! –
Por igual, desde o vasto azul, vertem
Sobre a terra a sua luz benigna, como
Se perfumassem de uma alma virgem
A sombria e sangrenta humanidade,
E tal vago aroma das flores se levanta.

Dá-me o sublime e o perfeito! Dá-me
Um desenho de Ângelo; uma espada
Com punho de Cellini, mais formosa
Que os tetos de marfim ornado com
Que a Natureza se apraz em lavrar.
Dá-me o crânio augusto no qual arderam
O universo de Hamlet e a fúria
Tempestuosa do moro; a índia
Cortesã que às margens do ameno rio
Que banha os muros do velho Chichén
Enxugava o esbelto corpo lustroso e limpo
Assim como os seus próprios cabelos
À sombra de um plátano pomposo.
Dá-me meu céu azul..., dá-me a pura,
A inefável, a plácida, a eterna alma
De mármore que a famosa Milo deu
Ao soberbo Louvre, como sua nata e flor.

(De: “Versos Livres”, 1913)

Eluciário:

Balsâmico: aromático, como o bálsamo;
Ângelo: Fra Angelico, pintor italiano (1400-1455);
Cellini (Benvenuto): ourives e escultor italiano (1500-1571);
Hamlet: protagonista de um dos principais dramas de Shakespeare;
Moro: alusão a Otelo, personagem da peça homônima de Shakespeare;
Chichén: antiga cidade maia localizada na Península de Yucatán;
Louvre: referência ao renomado museu francês;
Milo: a Vênus de Milo, famosa escultura grega.

Referência:

MARTÍ, José. Sed de belleza. In: __________. Obras completas. V. II: VI. Versos - Versos Libres. La Habana (CU): Editorial Lex, 1953. p. 1.380-1.381.

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