Giacomo Leopardi, o grande poeta italiano, destila todo o seu desencanto
e melancolia no poema a seguir, “A Se Stesso” (“A Si Mesmo”). Com desapego em
relação à maior de todas as forças – a do amor –, como que se despede do mundo,
onde já não vê quaisquer esperanças, senão pura “lama”, dado que a vida, para
ele, passou a denotar apenas “nojo e tédio”.
Nota-se na poesia certo lirismo destrutivo, originário, provavelmente,
da mesma fonte onde se saciaram nossos poetas românticos da fase do “Mal do
Século”, como Álvares de Azevedo e Casimiro de Abreu.
Mas o desencanto de Leopardi, que se predica mais latamente pelo
vocábulo “vacuidade”, poderia ser associado a um precedente muito mais vetusto,
vale dizer, ao Livro do Eclesiastes, onde se traduziria como “vaidade”, no famoso
versículo (Ecl 1,2): “Vaidade das vaidades – diz Coélet - tudo é vaidade”.
Para pacientes avançados em idade, até se poderia compreender os motivos
de tanto cansaço com a vida. Mas para pessoas jovens, tanto niilismo se reputa
incompreensível. Afinal, a vida tem belezas incontáveis!
J.A.R. – H.C.
Giacomo Leopardi
(1798-1837)
A Se Stesso
Or poserai per
sempre,
stanco mio cor. Peri
l’inganno estremo,
ch’eterno io mi
credei. Perì. Ben sento,
in noi di cari
inganni,
non che la speme, il desiderio è spento.
Posa per sempre.
Assai
palpitasti. Non val
cosa nessuna
i moti tuoi, né di
sospiri è degna
la terra. Amaro e
noia
la vita, altro mai
nulla; e fango è il mondo.
T’acqueta omai.
Dispera
l’ultima volta. Al
gener nostro il fato
non donò che il
morire. Omai disprezza
te, la natura, il
brutto
poter che, ascoso, a
comun danno impera,
e l’infinita vanità
del tutto.
Melancholy
(Domenico Feti:
1589-1623)
A Si Mesmo
(Giacomo Leopardi)
Enfim repousas sempre
Meu lasso coração.
Findo é o engano.
Que perpétuo julguei.
Findou. Bem sinto
Quem em nós dos caros
erros
Mais que a esperança,
o próprio anelo é extinto.
Repousa sempre. Muito
Palpitaste. Nenhuma
coisa vale
Teus impulsos, nem
digna é de suspiros
A terra. Nojo e tédio
É a vida, nada mais,
e lama é o mundo.
Repousa. E desespera
A última vez. À nossa
espécie o fado
Não deu mais que o
morrer. Enfim despreza
A natureza, o rudo
Poder que, oculto, o
comum dano gera
E a vacuidade sem
final de tudo.
Referência:
LEOPARDI, Giacomo. A si mesmo. Poesia – Cantos – XXVIII. Tradução de Alexei Bueno. In: __________. Poesia
e prosa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1996. p. 268.
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