Agora, diretamente da pena do escritor espanhol Jorge Guillén, trazemos
um belo poema, a fazer referência não aos gatos castelhanos (rs), mas aos
romanos. Consigne-se que, depois de aposentado, lá pelos fins dos anos 50, Guillén,
retornando dos EUA – para onde se dirigira em meados dos anos 30 –, passou a
residir na Itália, época, então, em que redigiu este poema.
Nota-se nos meandros da criação de Guillén uma clara alusão ao
passado glorioso de Roma, onde, hoje, circulam não renomadas figuras que
ficaram para a História – grafada assim, com letras maiúsculas, pelo poeta –, mas
inocentes bichanos, que se comprazem em lamber seus pelos e patas, indiferentes
ao que “dizem” as colunas postadas à sua frente.
Num cenário digno de Pasolini, como se estivéssemos nos arrabaldes da “Cidade
Eterna”, a paisagem se modifica pela construção de novos edifícios; e, então,
sem evocar as forças pretéritas, o fluxo temporal da urbe se esvai, apático e
quase improgressivo.
J.A.R. – H.C.
Jorge Guillén
(1893-1984)
Gatos de Roma
Los gatos,
No vagabundos pero
sin un dueño,
Al sol adormecidos
En calles sin aceras,
O esperando una mano
dadivosa
Tal vez por entre
ruinas,
Los gatos,
Inmortales de modo tan
humilde,
Retan al tiempo,
duran
Atravesando las
vicisitudes,
Sin saber de la
Historia
Que levanta edificios
O los deja abismarse
entre pedazos
Bellos aún, ahora
apoyos nobles
Do esas figuras:
libres.
Mirada fija de unos
ojos verdes
En soledad, en ocio y
luz remota.
Entrecerrados ojos,
Rubia la piel y calma
iluminada.
Erguido junto a un
mármol,
Superviviente resto
de columna,
Alguién feliz y
pulcro
Se atusa con la pata
relamida.
Gatos. Frente a la
Historia,
Sensibles, serios,
solos, inocentes.
Gatos de Roma
Os gatos,
Não vagabundos mas
sem um dono,
Ao sol adormecidos
Em ruas sem calçadas,
Ou esperando uma mão dadivosa
Talvez por entre
ruínas,
Os gatos,
Imortais de modo tão
humilde,
Desafiam o tempo, resistem
Atravessando as
vicissitudes,
Sem saber da História
Que levanta edifícios
Ou os deixa
abismar-se entre pedaços
Belos ainda, agora suportes nobres
Dessas figuras:
livres.
Olhar fixo de uns
olhos verdes,
Em solidão, em ócio e
luz remota.
Semicerrados olhos,
Loira a pelagem e
calma iluminada.
Erguido junto a um
mármore,
Sobrevivente resto de
coluna,
Alguém feliz e pulcro
Alisa-se com a pata
lambida.
Gatos. Frente à
História,
Sensíveis, sérios,
sozinhos, inocentes.
Referência:
GUILLÉN, Jorge. Gatos de Roma. In: __________. Suite italienne. Milán, IT:
All’insegna del pesce d’oro, 1964. p. 26.
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