A beleza teria algum sentido de harmonia que poderia ser racionalizado por
um meio inteligível? Veja o leitor o que pensa o investigador espanhol Jorge
Wagensberg: diz-nos ele que um ataque à inteligibilidade das coisas ofenderia menos
que um ataque à beleza. À primeira vista, talvez um nonsense. Mas até que se
tome conhecimento da linha de argumentação do escritor, exposta nos parágrafos
subsequentes!
J.A.R. – H.C.
Jorge Wagensberg
(Universidade de
Barcelona)
A falta de
inteligibilidade frustra ou ofende o cérebro. O mesmo ocorre com a falta de
beleza. A pessoa se treina para captar a inteligibilidade cada vez que
representa a realidade. A pessoa se treina para captar a beleza da mesma forma.
Pode-se ser sábio e ignorante em temas de inteligibilidade. Pode-se ser sábio e
ignorante em temas de beleza. A inteligibilidade de um objeto ou fenômeno da
realidade não se decide por sufrágio universal. O mesmo ocorre com a beleza de
um objeto ou fenômeno da realidade. Na hora de gozar compreendendo, nem tudo vale.
Nem tudo vale na hora de gozar a beleza. A essência da inteligibilidade está no
comum entre o diverso, ou seja, na repetição ou regularidade no espaço
(harmonia) e no tempo (ritmo).
O mesmo ocorre com a
beleza. A beleza está na harmonia e no ritmo entre as partes de um todo. A
inteligibilidade está na harmonia e no ritmo entre diferentes todos. Por isso
talvez se possa assegurar que a beleza é a inteligibilidade interna das coisas e
que a inteligibilidade é a beleza externa das coisas. A beleza de uma esfera
está na relação de qualquer pedaço de esfera com qualquer outro pedaço da mesma
esfera. Essa é sua perfeição. Essa é a perfeição platônica. A inteligibilidade
de uma esfera está na relação entre diferentes objetos esféricos, um sol, um
planeta, um animal acocorado, uma melancia, um olho, uma bolha, um antiquíssimo
grão de areia... É mais fácil compreender a esfera que gozar de sua beleza?
Alguém pode dizer: compreendo a esfera, mas não me parece especialmente bela.
Tudo bem, ninguém é perfeito. A beleza e a inteligibilidade têm diferentes grau
e classe de universalidade, mas ambas existem e nenhuma delas é trivial. Um
ataque contra a inteligibilidade ofende, é verdade, mas temo que ainda ofende
mais um atentado contra a beleza. (WAGENSBERG, 2009, p. 230-231)
O Pensador
(Augusto Rodin: 1840-1917)
Referência:
WAGENSBERG, Jorge. O gozo intelectual: teoria e prática sobre a inteligibilidade e a
beleza. Tradução: Simone Mateos. Campinas, SP: Editora da Unicamp, 2009.
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