Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

domingo, 4 de maio de 2014

Borges e o seu Gato Branco

Já aqui aparecido, num outro poema, Borges agora retorna para nos falar das dúvidas que temos quando vemos os animais – o seu gato branco Beppo, no caso, presente na foto acima com o escritor – mirarem-se num espelho.

De minha parte, penso que, sobretudo entre os bichos do sexo masculino, eles julgam que passou a haver concorrência ao domínio mais ou menos absoluto que antes detinham no mesmo espaço. Ou, então, por que será que um belo bem-te-vi, todas as manhãs, posta-se em frente ao vidro espelhado, no moderno prédio diante do meu apartamento, e fica ali bicando a vidraça até não poder mais resistir ao cansaço? (rs).

Uma nota: Beppo é a abreviatura de “Giuseppe”, esposo de Laura, no famoso poema em italiano, do inglês Lord Byron, “Beppo: uma história veneziana”. Como se nota, Borges nomeia o seu gato com uma referência que não exorbita à própria literatura...

J.A.R. – H.C.

Borges e Beppo
(Foto de Paola Agosti em 1980)

Beppo

El gato blanco y célibe se mira
en la lúcida luna del espejo
y no puede saber que esa blancura
y esos ojos de oro que no ha visto
nunca en la casa son su propia imagen.
¿Quién le dirá que el otro que lo observa
es apenas un sueño del espejo?
Me digo que esos gatos armoniosos,
el de cristal y el de caliente sangre,
son simulacros que conceden al tiempo
un arquetipo eterno. Así lo afirma,
sombra también, Plotino en las Ennéadas.
¿De qué Adán anterior al paraíso,
de qué divinidad indescifrable
somos los hombres un espejo roto?
   

Beppo

O gato branco e solipso se mira
na lúcida lua do espelho
e não pode saber que tal brancura
e esses olhos de ouro nunca vistos
antes na casa são a sua própria imagem.
Quem lhe dirá que o outro que o observa
é apenas um sonho do espelho?
Digo-me que esses gatos harmoniosos,
o de cristal e o de quente sangue,
são simulacros que concedem ao tempo
um arquétipo eterno. Assim o afirma,
pressagia também, Plotino nas Enéadas.
De que Adão anterior ao paraíso,
de que divindade indecifrável
somos os homens um espelho fendido?

Referência:

BORGES, Jorge Luis. Beppo. In: __________. Obras completas: 1975-1985; La cifra. Tomo II. 1. ed. Buenos Aires: Emecé, 1989. p. 297.
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