Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

segunda-feira, 12 de maio de 2025

Hart Crane - A Planta do Ar

O poeta celebra a força, a resiliência e a adaptação de uma planta aérea que cresce em um entorno árido e salino, em terras da ilha Grand Cayman, no Caribe: muito provavelmente, trata-se de uma bromélia da espécie tillandsia, a julgar pela descrição de Crane sobre a forma como ela se nutre da salinidade do ar, agarrada a um tronco de palmeira, próximo à enseada.

 

Um pouco de Botânica: a tillandsia é uma planta epífita (que cresce em outra planta, sem parasitá-la) nativa daquela região, sendo chamadas de “planta aérea” porque obtém água e nutrientes do ar e não precisa de solo para crescer, aderindo a superfícies diversas, como galhos e cascas de árvores, fios telefônicos e pedras nuas.

 

Essa situação de existência precária, vulnerabilidade e conexão direta com o ar – ao mesmo tempo, seu alimento e potencial ameaça, quando convertido em tufões, muito comuns naquela área –, pode servir de metáfora para a nossa capacidade de adaptação e de conexão com as forças que nos rodeiam, o que acaba por evocar, de certa maneira, algumas das ideias de Darwin (1809-1882), sobre a evolução das espécies.

 

J.A.R. – H.C.

 

Hart Crane

(1899-1932)

 

The Air Plant

 

Grand Cayman

 

This tuft that thrives on saline nothingness,

Inverted octopus with heavenward arms

Thrust parching from a palm-bole hard by the cove

A bird almost – of almost bird alarms,

 

Is pulmonary to the wind that jars

Its tentacles, horrific in their lurch.

The lizard’s throat, held bloated for a fly,

Balloons but warily from this throbbing perch.

 

The needles and hack-saws of cactus bleed

A milk of earth when stricken off the stalk;

But this, – defenseless, thornless, sheds no blood,

Almost no shadowbut the airs thin talk.

 

Angelic Dynamo! Ventriloquist of the Blue!

While beachward creeps the shark-swept Spanish Main

By what conjunctions do the winds appoint

Its apotheosis, at last – the hurricane!

 

(1927)

 

Tillandsia Fasciculata

(Mary Vaux Walcott: artista norte-americana)

 

A Planta do Ar

 

Grand Cayman

 

Esse tufo que nasce de um salobro nada,

Polvo invertido, braços para o céu,

Rebento ressequido de palmeira de angra,

Quase ave – de ave quase um escarcéu,

 

É pulmonar ao vento que lhe move

Os tentáculos num meneio traiçoeiro.

A goela do lagarto, absorto com a mosca,

Infla-se, cauta, nesse trêmulo poleiro.

 

Serras e acúleos do cactus sangram

Leite da terra quando os vão cortar,

Mas este, sem espinhos, não espalha sangue,

Quase nem sombra, só a fala do ar.

 

Dínamo angelical! Ventríloquo do Azul!

Enquanto o mar, covil de tubarões, se esgueira

Na praia, que conjuração dos ventos urde

O furacão – a apoteose derradeira!

 

(1927)

 

Referência:

 

CRANE, Hart. The air plant / A planta do ar. Tradução de Augusto de Campos. In: CAMPOS, Augusto de (Seleção e Tradução). Poesia da recusa. São Paulo, SP: Perspectiva, 2006. Em inglês: p. 308; em português: p. 309.

 

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