O falante encontra-se
à espera do Ano-Novo, oprimido pelo tempo a impor desgaste a tudo quanto se lhe
apresenta como real, deixando-lhe nos cabelos os efeitos desse embate, a saber,
as cãs antecipatórias do outono da vida, frente às quais não faz o homem senão
voltar-se sobre si mesmo, para buscar a quem censurar por sua ímproba forma de
ser.
Uma vida cheia de
oportunidades perdidas e de arrependimentos depara-se com a necessidade de
purga e de expiação, para que se possa transmutar a “agonia” a um sabor de gáudio,
longe da sensação de melancolia e de taciturnidade que a muitos atinge durante
esta quadra: que neste novo ano sejamos mais resilientes para superar os obstáculos,
renovando-nos para celebrar a eternidade desde agora!
J.A.R. – H.C.
Héctor Rojas Herazo
(1921-2002)
Estampa de Año Nuevo
Miras el tiempo
atrás, miras tu sangre,
tus derrotadas horas,
tu sonido,
malhayando un tal vez
y un no me importa.
Fundido con el mar,
la muerte, el sueño,
purgas en lo que
fuiste, quieres pena,
regresas al aroma de
un miércoles, al sigilo
de tus desnudos pies
en una alcoba.
Recordando un
recuerdo, te preguntas
por lo que pudo ser y
lo que ha sido.
Lo que eres, lo que
tu sed y tu suplicio afirma.
Y encuentras tu
carcomido sol, tu mismo luto,
tu misma piel ajada,
tu idéntica manera de
verte en un espejo
con el tiempo
lamiendo tus espaldas.
Pruebas la eternidad:
el ancho, el filo de
un rencoroso diente.
Es entonces cuando te
vuelves sin saber
y escuchas, cuando
abrazas y ríes,
cuando dices con
amable terror,
de labios para afuera
o para adentro:
“Te felicito, amigo;
te mereces
el año, la agonía que
has ganado”.
Y con tu voz sacudes
la ceniza
que la muerte ha
dejado en sus cabellos.
En: “Las Úlceras de
Adán” (1995)
A Cidade Natalina
(Alla Kyslyakova:
artista ucraniana)
Cartão de Ano-Novo
Olhas para trás no tempo
e vês teu sangue,
tuas derrotadas
horas, teu discurso,
deplorando um talvez
e um não me importa.
Fundido com o mar, a
morte, o sonho,
purgas no que foste,
queres pena,
regressas ao aroma de
uma quarta-feira,
à privança de teus
pés desnudos numa alcova.
Recordando uma lembrança,
te perguntas
sobre o que poderia
ter sido e o que foi.
O que és, o que
afirmam tua sede e teu tormento.
E encontras teu
carcomido sol, teu próprio luto,
tua própria pele
desgastada,
teu modo idêntico de te
ver num espelho
com o tempo a lamber
tuas costas.
Provas a eternidade:
a largueza, o gume de
um rancoroso dente.
E quando então te viras
sem saber
e escutas, quando
abraças e ris,
quando dizes com suave
terror,
dos lábios para fora
ou para dentro:
“Felicito-te, amigo;
mereces
o ano, a agonia que ganhaste”.
E com tua voz sacodes
a cinza
que a morte deixou em
seus cabelos.
Em: “As Úlceras de
Adão” (1995)
Referência:
HERAZO, Héctor Rojas.
Estampa de año nuevo. In: __________. Las esquinas del viento:
antología. Selección y prólogo de Juan Manuel Roca y Felipe Agudelo. 1. ed.
Medellín, CO: Fondo Editorial Universidad EAFIT, nov. 2001. p. 136.
Nenhum comentário:
Postar um comentário