A uma visão objetiva
e distanciada do que se costuma chamar pelo substantivo “pátria” – com foco em
seu aspecto geográfico representado em projeções cartográficas, nas quais um
dado país tem um contorno bem delimitado, enquanto conjunto de rios,
cordilheiras, montanhas e outros acidentes físicos –, a falante contrapõe outra
abordagem, mais pessoal e subjetiva, segundo a qual a pátria seria melhor retratada
como uma comunidade de pessoas.
Nesse caso, compartilham
elas um sentimento de solidariedade e, em sua individualidade, comungam de uma
fé inquebrantável na liberdade, refletindo a crença, otimista e esperançosa, de
que a pátria pode superar os inúmeros desafios com que se depara no curso de sua
história, a partir de uma identidade nacional arrimada num compromisso
coletivo.
Tudo muito bem: mas
vai aqui um contraponto que se oferece ao leitor, tendo em vista a abordagem
absolutamente distorcida que muitos políticos, sobretudo da ultradireita,
adotam em relação à liberdade – mormente a de expressão –, lançando mão de fake
news com frequência, cometendo delitos à mancheia, nomeadamente contra a honra
de seus opositores, estejam eles a operar em quaisquer dos Poderes da República:
liberdade está em conexão direta com responsabilidade, pois que, do contrário,
não passa de arbitrariedade, obviamente a ser combatida pelos meios legais.
Veja-se o que nos diz
o famoso neuropsiquiatra austríaco Viktor Frankl (1905-1997), em determinada passagem de
sua obra “Em busca de sentido” (vide especificação completa no campo de “Referências”):
“A liberdade (...)
não é a última palavra. Não é mais que parte da história e metade da verdade.
Liberdade é apenas o aspecto negativo do fenômeno integral cujo aspecto
positivo é responsabilidade. Na verdade, a liberdade está em perigo de
degenerar, transformando-se em mera arbitrariedade, a menos que seja vivida em
termos de responsabilidade”. (FRANKL, 2008, p. 154)
J.A.R. – H.C.
Bruna Lombardi
(n. 1951)
Porteiras
Vi minha pátria a
primeira vez num mapa
eu curiosa de rios,
cordilheiras
os nomes das
montanhas
os acidentes
minha pátria era um contorno.
Depois fui conhecendo
minha pátria
olhando os olhos das
pessoas pelas ruas
a minha história
misturada com a dos outros
com a de todos
somos todos uma
pátria e um sentimento
solitários,
solidários.
Minha pátria somos
nós nessa praça
acreditando que virá
um tempo de se restaurar
toda a verdade
nós que choramos, que
lutamos, que temos uma fé
inabalável na palavra
liberdade.
Farol, mar e gaivotas
(Elena Reutova:
artista russa)
Referências:
FRANKL, Viktor. Em
busca de sentido: um psicólogo no campo de concentração. Tradução de Walter
O. Schlupp e Carlos C. Aveline. 25 ed.
São Leopoldo, RS: Sinodal; Petrópolis, RJ: Vozes, 2008.
LOMBARDI, Bruna.
Porteiras. In: __________. O perigo do dragão. São Paulo, SP: Círculo do
Livro, 1984. p. 21.
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