Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quarta-feira, 29 de janeiro de 2025

Daniel Jonas - O vento

Ao falante, a tentativa, o esforço, a conquista, o desejo, o enfrentamento de ideias – inclusive a de começar a falar –, parecem-lhe desgastantes, tampouco suscitam vestígios alentadores. Sob tal abordagem do mundo, tudo é sempre o mesmo: nada importa, nada muda, nada se granjeia, pois, em última instância, esta seria a casa do vazio e do sem-sentido.

 

Para além dessa visão um tanto niilista, o vento acaba por se tornar o único elemento capaz de se mover, de se trasladar, de comportar um pouco de substância que se equipare à vida, integrando-se à realidade do ente lírico talvez como metáfora de uma força elementar e sem pretensões, do simples existir por existir, sem o peso monotônico e fatigante dos esforços humanos.

 

Subjacente aos versos do poema, o questionamento sobre o sentido da vida, essa interrogante complexa, que invariavelmente se posta mais à frente de qualquer empreendimento a que se dê partida. Afinal, a leibniziana “razão suficiente” se nos apresenta a casa instante como uma condição incontornável para que nos voluntariemos a porfiar contra os bastiões da prostração!

 

J.A.R. – H.C.

 

Daniel Jonas

(n. 1973)

 

O vento

 

Porque não há nada em vez de tudo? – perguntou

o cientista. – Tudo me cansa:

a tentativa, o esforço, o consegui-lo.

Tudo é redondamente inútil:

o desejo, o seu decesso.

O confronto de ideias então

apavora-me. Até mesmo a ideia de começar a falar,

a indústria de se ganhar algo, o movimento

são desgastantes antes de si.

Tudo é absolutamente a mesma coisa.

Nada conquista nada.

O vento é.

 

Em: “Bisonte” (2016)

 

Vento soprando pela casa de pedra

(Raymond Lewis: pintor norte-americano)

 

Referência:

 

JONAS, Daniel. O vento. In: __________. Os fantasmas inquilinos: poemas escolhidos. Seleção e posfácio por Mariano Marovatto. 1. ed. São Paulo, SP: Todavia, 2019. p. 66.

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