Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

segunda-feira, 21 de outubro de 2024

John Hewitt - Substância e Sombra

O poeta recorre a metáforas para representar a natureza e a realidade, empregando imagens que assumem graduações entre o tangível e o efêmero, entre o factual e o ilusório, entre a “sombra” e a “substância”, ou ainda, entre a maleabilidade da “percepção” e os ancoradouros “de bronze ou de pedra” – onde se presume haver mais estabilidade e empenho em se buscar a verdade.

 

As imagens que criamos em nossas mentes são, segundo o poeta, áridas ou austeras o suficiente para que possamos ter uma compreensão do mundo o mais ampla possível, o que nos leva a permanecermos quase sempre na superficialidade platônica das aparências que povoam nosso quotidiano, limitando-nos as aventuras com potencial para adentrar o complexo espaço para além das coisas que julgamos, amiúde aprioristicamente, inacessíveis.

 

J.A.R. – H.C.

 

John Hewitt

(1907-1987)

 

Substance and Shadow

 

There is a bareness in the images

I temper time with in my mind’s defence;

they hold their own, their stubborn secrecies;

no use to rage against their reticence:

a gannet’s plunge, a heron by a pond,

a last rook homing as the sun goes down,

a spider squatting on a bracken-frond,

and thistles in a cornsheaf’s tufted crown,

a boulder on a hillside, lichen-stained,

the sparks of sun on dripping icicles,

their durable significance contained

in texture, colour, shape, and nothing else.

All these are sharp, spare, simple, native to

this small republic I have charted out

as the sure acre where my sense is true,

while round its boundaries sprawl the screes of doubt.

 

My lamp lights up the kettle on the stove

and throws its shadow on the whitewashed wall,

like some Assyrian profile with, above,

a snake, or bird-prowed helmet crested tall;

but this remains a shadow; when I shift

the lamp or move the kettle it is gone,

the substance and the shadow break adrift

that needed bronze to lock them, bronze or stone.

 

Sombras

(George Psaroudakis: artista grego)

 

Substância e Sombra

 

Há certa aridez nas imagens com as quais

modero o tempo, em defesa da minha mente;

mantêm elas os seus próprios e obstinados segredos;

de nada serve exasperar-me contra as suas reticências:

o mergulho de um alcatraz, uma garça junto a uma lagoa,

uma última gralha que ao pôr do sol regressa ao ninho,

uma aranha a aconchegar-se numa fronde de samambaia,

e cardos na coroa de tufos de um feixe de milho;

um rochedo numa encosta, manchado por líquenes,

os fulgores do sol sobre os sincelos gotejantes,

seu perdurável significado integrado

à textura, à cor, à forma – e nada mais.

Tudo isso é incisivo, frugal, simples, nativo

dessa pequena república que ora mapeio,

enquanto gleba segura onde minha percepção é fiável,

para além de cujas lindes avultam os pedregais da dúvida.

 

Minha lamparina ilumina a chaleira no fogão

e projeta sua sombra contra a parede caiada de branco,

como um perfil assírio encimado por uma serpente

ou um elmo aproado com ave de fastigioso penacho;

mas tal não passa de uma sombra; quando mudo

a lamparina de posição ou movo a chaleira, ela se vai;

a substância e a sombra desatracam

do bronze necessário para fundeá-las – bronze ou pedra.

 

Referência:

 

HEWITT, John. Substance and shadow. In: __________. The collected poems of John Hewitt. Edited by Frank Ormsby. Newtownards, NIR: Blackstaff Press, 1991. p. 191.

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