Rumi vislumbra uma
conexão intrínseca entre todos os seres e fenômenos do universo e a unidade
fundamental que subjaz em cada existência individual: somos “um” em essência, congregados ao divino, pois
que transcendemos às aparentes diferenças por meio da presença naquilo que traduz
criatividade, luz e beleza.
Encontramo-nos no
vasto mar da sempiterna fluidez, ubíquos nas distintas formas de expressão –
desde as minúsculas e imperceptíveis até as mais vastas e radiosas –, no ser e no
não-ser que a tudo abarca, que é interlocução e silêncio, a denotar a axiomática
inteligência que põe em movimento os fios desta trama que – no dizer do “poetinha”
– não sabemos “bem ao certo onde vai dar”!
J.A.R. – H.C.
Jalal ud-Din Rumi
(1207-1273)
[Eu sou Tu]
Sou as partículas de
pó à luz do sol,
sou o círculo solar.
Ao pó digo: “não te
movas”,
e ao sol: “segue
girando”.
Sou a névoa da manhã
e a brisa da tarde.
Sou o vento na copa
das árvores
e as ondas contra o
penhasco.
Sou o mastro, o leme,
o timoneiro e a quilha
e o recife de coral
em que naufragam as embarcações.
Sou a árvore em cujo
galho tagarela o papagaio,
sou silêncio e
pensamento, e também todas as vozes.
Sou o ar pleno que
faz surgir a música da flauta,
a centelha da pedra,
o brilho do metal.
Sou a vela acesa e a
mariposa
girando louca ao seu
redor.
Sou a rosa e o
rouxinol
perdido em sua
fragrância.
Sou todas as ordens
de seres,
a galáxia girante,
a inteligência
imutável,
o ímpeto e a
deserção.
Sou o que é
e o que não é.
Tu, que conheces
Jalal ud-Din,
Tu, o Um em tudo,
diz quem sou.
Diga: Eu sou
Tu.
Barco, perto de
Veneza
(Edward William Cooke:
pintor inglês)
Referência:
RUMI, Jalal ud-Din.
[Eu sou Tu]. Tradução de José Jorge de Carvalho. In: __________. Poemas místicos:
seleção de poemas do Divan de Shams de Tabriz. Seleção, tradução e
introdução de José Jorge de Carvalho. 2. ed. 1. reimp. São Paulo, SP: Attar
Editorial, 2010. p. 154-155.
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