Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

sexta-feira, 16 de agosto de 2024

Octavio Paz - Escrita

Tendo por mote a natureza do ato de escrever e a relação do poeta com a sua própria criatividade, Paz nestas linhas se detém a refletir sobre a inspiração e o aparente mistério por trás do ir e vir da pena sobre o papel, como se estivesse sendo guiada por uma força que transcende a figura do próprio escrevinhador, digo melhor, uma entidade ou presença que por meio dele se expressa, a fazer fluir a poesia de um recôndito ou incógnito manancial.

 

Nesse sítio apartado – tranquilo e misterioso –, o poeta libera-se de suas preocupações mundanas e imerge nas águas da galáxia criativa, em meio às quais uma força crítica e depuradora – complexa e cheia de intestinas contradições – pondera e delibera sobre cada palavra, em busca da perfeição daquilo que, lavrado em forma de escrita, se projeta para o futuro.

 

J.A.R. – H.C.

 

Octavio Paz

(1914-1998)

 

Escritura

 

Cuando sobre el papel la pluma escribe,

a cualquier hora solitaria,

¿quién la guía?

¿A quién escribe el que escribe por mí,

orilla hecha de labios y de sueño,

quieta colina, golfo,

hombro para olvidar al mundo para siempre?

 

Alguien escribe en mí, mueve mi mano,

escoge una palabra, se detiene,

duda entre el mar azul y el monte verde.

Con un ardor helado

contempla lo que escribo.

Todo lo quema, fuego justiciero.

Pero este juez también es víctima

y al condenarme, se condena:

no escribe a nadie, a nadie llama,

a sí mismo se escribe, en sí se olvida,

y se rescata, y vuelve a ser yo mismo.

 

O Escritor

(Périclès Pantazis: pintor grego)

 

Escrita

 

Quando sobre o papel a pena escreve,

a qualquer hora solitária,

quem a guia?

A quem escreve o que escreve por mim,

margem feita de lábios e de sonho,

quieta colina, golfo,

ombro para esquecer o mundo para sempre?

 

Alguém escreve em mim, move-me a mão,

escolhe uma palavra, queda, incerta,

entre o azul do oceano e o monte verde.

Com um ardor gelado

contempla o que eu escrevo.

A tudo queima, fogo justiceiro.

Porém este juiz também é vítima

e, ao condenar-me, se condena:

não escreve a ninguém, a ninguém chama,

a si mesmo se escreve, em si se olvida,

e se resgata, e volve a ser eu mesmo.

 

Referência:

 

PAZ, Octavio. Escritura / Escrita. Tradução de Aurélio Buarque de Holanda Ferreira. In: FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda (Seleção e tradução). Grandes vozes líricas hispano-americanas. Edição bilíngue: espanhol x português. Rio de Janeiro, RJ: Nova Fronteira, 1990. Em espanhol: p. 308; em português: p. 309. (Coleção ‘Poesia de todos os tempos’)

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