Tendo por mote a
natureza do ato de escrever e a relação do poeta com a sua própria
criatividade, Paz nestas linhas se detém a refletir sobre a inspiração e o
aparente mistério por trás do ir e vir da pena sobre o papel, como se estivesse
sendo guiada por uma força que transcende a figura do próprio escrevinhador,
digo melhor, uma entidade ou presença que por meio dele se expressa, a fazer
fluir a poesia de um recôndito ou incógnito manancial.
Nesse sítio apartado –
tranquilo e misterioso –, o poeta libera-se de suas preocupações mundanas e imerge
nas águas da galáxia criativa, em meio às quais uma força crítica e depuradora –
complexa e cheia de intestinas contradições – pondera e delibera sobre cada
palavra, em busca da perfeição daquilo que, lavrado em forma de escrita, se
projeta para o futuro.
J.A.R. – H.C.
Octavio Paz
(1914-1998)
Escritura
Cuando sobre el papel
la pluma escribe,
a cualquier hora
solitaria,
¿quién la guía?
¿A quién escribe el
que escribe por mí,
orilla hecha de labios
y de sueño,
quieta colina, golfo,
hombro para olvidar
al mundo para siempre?
Alguien escribe en
mí, mueve mi mano,
escoge una palabra,
se detiene,
duda entre el mar
azul y el monte verde.
Con un ardor helado
contempla lo que
escribo.
Todo lo quema, fuego
justiciero.
Pero este juez
también es víctima
y al condenarme, se
condena:
no escribe a nadie, a
nadie llama,
a sí mismo se
escribe, en sí se olvida,
y se rescata, y
vuelve a ser yo mismo.
O Escritor
(Périclès Pantazis: pintor
grego)
Escrita
Quando sobre o papel
a pena escreve,
a qualquer hora
solitária,
quem a guia?
A quem escreve o que
escreve por mim,
margem feita de
lábios e de sonho,
quieta colina, golfo,
ombro para esquecer o
mundo para sempre?
Alguém escreve em
mim, move-me a mão,
escolhe uma palavra, queda,
incerta,
entre o azul do
oceano e o monte verde.
Com um ardor gelado
contempla o que eu
escrevo.
A tudo queima, fogo
justiceiro.
Porém este juiz
também é vítima
e, ao condenar-me, se
condena:
não escreve a ninguém,
a ninguém chama,
a si mesmo se escreve,
em si se olvida,
e se resgata, e volve
a ser eu mesmo.
Referência:
PAZ, Octavio.
Escritura / Escrita. Tradução de Aurélio Buarque de Holanda Ferreira. In:
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda (Seleção e tradução). Grandes vozes
líricas hispano-americanas. Edição bilíngue: espanhol x português. Rio de
Janeiro, RJ: Nova Fronteira, 1990. Em espanhol: p. 308; em português: p. 309.
(Coleção ‘Poesia de todos os tempos’)
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