Num dia como o de hoje,
há quem recorde de seu pai envolto em imagens, palavras e fatos já meio desvanecidos
pelo tempo. Mas não o poeta: nesta primeira parte de um longo poema em seis (6)
seções, Strand descreve com riqueza de detalhes aquilo que viu e sentiu no
instante mesmo em que seu pai migrou definitivamente para outros incógnitos
mundos.
Mesmo com o corpo físico
presente, não há como se preencher o vazio deixado pela
pessoa real: as vívidas descrições do entorno natural acabam por criar um
contraste entre a presença ostensiva do mundo exterior e a ausência de vida, de um espírito ativo, no
corpo do falecido pai.
Dor, quietude,
melancolia e tristeza embargam as palavras factíveis para o momento, levando a disrupção
a falar mais alto: mesmo os pronomes possessivos empregados pelo poeta alternam-se
no correr dos versos, passando de um personalíssimo “your(s)” a um amorfo “its”,
já agora direcionado a uma coisa, isto é, um corpo sem vida.
J.A.R. – H.C.
Mark Strand
(1934-2014)
(Robert Strand 1908-1968)
I. The empty body
The hands were yours, the arms were yours,
But you were not there.
The eyes were yours, but they were closed
and would not open.
The distant sun was there.
The moon poised on the hill’s white shoulder
was there.
The wind on Bedford Basin was there.
The pale green light of winter was there.
Your mouth was there,
But you were not there.
When somebody spoke, there was no answer.
Clouds came down
And buried the buildings along the water,
And the water was silent.
The gulls stared.
The years, the hours, that would not find you
Turned in the wrists of others.
There was no pain. It had gone.
There were no secrets. There was nothing to say.
The shade scattered its ashes.
The body was yours, but you were not there.
The air shivered against its skin.
The dark leaned into its eyes.
But you were not there.
In: “The Story of Our
Lives” (1973)
O funeral do pai
(Jennifer Waters: artista
canadense)
Elegia para Meu Pai
(Robert Strand
1908-1968)
I. O corpo vazio
As mãos eram tuas, os
braços eram teus,
Mas tu não estavas lá.
Os olhos eram teus,
mas estavam fechados
e não mais se abririam.
O sol distante estava
lá.
A lua aprumada sobre
o ombro branco da colina
estava lá.
O vento em Bedford
Basin estava lá.
A pálida luz verde do
inverno estava lá.
Tua boca estava lá,
Mas tu não estavas
lá.
Quando alguém falava,
não havia resposta.
As nuvens desciam
E enterravam os
edifícios ao longo da água,
E a água ficava em
silêncio.
As gaivotas olhavam
fixamente.
Os anos, as horas,
que não te encontrariam,
Redirecionavam-se aos
pulsos dos outros.
Não havia dor. Ele
havia partido.
Não havia segredos. Nada
havia a dizer.
A sombra dispersou
suas cinzas.
O corpo era o teu, mas
tu não estavas lá.
O ar estremecia contra
a sua pele.
A escuridão pousou em
seus olhos.
Mas tu não estavas
lá.
Em: “A História de
Nossas Vidas” (1973)
Referência:
STRAND, Mark. Elegy
for my father: I. The empty body. In: __________. New selected poems. First
paperback edition. New York, NY: Alfred A. Knopf, jan. 2009. p. 71.
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