Alpes Literários

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Subtítulo

UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

sábado, 3 de agosto de 2024

Antonia Pozzi - Oração à Poesia

Num diálogo franco com a Poesia, Pozzi tece uma paisagem simbólica do deperecimento do espaço sagrado que com ela mantinha até então, dirigindo-lhe um apelo para que volte a ser sua guia, ajudando-a a recuperar sua autenticidade e conexão com o sublime e o elevado: trata-se, sob tal contexto, de uma súplica por redenção e renovação, a externar um desejo de reconciliação com a sua própria voz poética.

 

O leitor pode perceber o tom geral de confissão e de arrependimento infundido pela poetisa aos versos, como se estivesse a assumir os seus pecados, buscando redimir-se perante a Poesia, nela distinguindo uma espécie de força transcendental com o poder para lhe curar a alma – um bálsamo eficaz para todos os pesares.

 

J.A.R. – H.C.

 

Antonia Pozzi

(1912-1938)

 

Preghiera alla Poesia

 

Oh, tu bene mi pesi

l’anima, poesia:

tu sai se io manco e mi perdo,

tu che allora ti neghi

e taci.

 

Poesia, mi confesso con te

che sei la mia voce profonda:

tu lo sai,

tu lo sai che ho tradito,

ho camminato sul prato d’oro

che fu mio cuore,

ho rotto l’erba,

rovinata la terra –

poesia – quella terra

dove tu mi dicesti il più dolce

di tutti i tuoi canti,

dove un mattino per la prima volta

vidi volar nel sereno l’allodola

e con gli occhi cercai di salire –

Poesia, poesia che rimani

il mio profondo rimorso,

oh aiutami tu a ritrovare

il mio alto paese abbandonato –

Poesia che ti doni soltanto

a chi con occhi di pianto

si cerca –

oh rifammi tu degna di te,

poesia che mi guardi.

 

Pasturo, 23 agosto 1934

 

Rumores da Terra

(Wifredo Lam: pintor cubano)

 

Oração à Poesia

 

Ó, tu bem me pesas

a alma, poesia:

tu sabes se falto e me perco,

tu que agora te negas

e te calas.

 

Poesia, eu confesso a ti

que és minha voz profunda:

tu o sabes,

tu sabes que traí,

caminhei no prado de ouro

que fora meu coração,

rompi a relva,

arruinada a terra –

poesia – aquela terra

onde tu me disseras o mais doce

de todos os teus cantos,

onde uma manhã pela primeira vez

vira voar no sereno a cotovia

e com os olhos tentara subir –

Poesia, poesia que conservas

meu profundo remorso,

ó, ajuda-me tu a reencontrar

meu alto país abandonado –

Poesia que te entregas somente

a quem com olhos de pranto

se busca –

ó, refaz-me tu digna de ti,

poesia que me guardas.

 

Pasturo, 23 de agosto de 1934

 

Referência:

 

POZZI, Antonia. Preghiera alla poesia / Oração à poesia. Tradução de Camila Vicentini Camargo e Cláudia Tavares. (n.t.) Revista Nota do Tradutor, n. 23, vol. especial, 2021; em italiano: p. 290-291; em português: p. 296-297. Disponível neste endereço. Acesso em: 23 jul. 2024.

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