Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

sexta-feira, 2 de agosto de 2024

Hilda Hilst - Quase Bucólicas (I)

Num mundo a impor expectativas, ainda que sob uma moldura de limitações, a falante anseia por resgatar a vitalidade e a sinceridade da infância, enquanto questiona as construções artificiais e os ideais ilusórios da sociedade: a tranquilidade em cenários bucólicos não lhe basta, pois que suas aspirações poéticas, o potencial de sua expressão lírica, vão bem além das promessas nela vislumbradas.

 

Nesse sentido, o poema acaba por afirmar que a condição humana consiste em “despojar-se”, no caso, mesmo em relação à percepção do mundo e sua forma de expressão herdada por influência social ou cultural, ou de outro modo, deixando ir as máscaras, as convenções e as antevidências grupais, tudo em busca de se alcançar um modelo de conduta mais autêntico e verdadeiro.

 

J.A.R. – H.C.

 

Hilda Hilst

(1930-2004)

 

Quase Bucólicas

 

(I)

 

Entre cavalos e verdes pensei meu canto.

Entre paredes, murais, lamentos, ais

(Um cenário acanhado para o canto

E triste

Se o que dele se espera é até demais)

Pretendi cantar mais alto que entre os verdes

E encantar

O meu sentir cansado

Naquele melhor sentir de quando era menina.

 

Vontade de voltar às minhas fontes primeiras.

De colocar meus mitos outra vez

Nos lugares antigos e sorrir

Como a ti te sorri, minha mãe, a vez primeira.

Vontade de esquecer o que aprendi:

Os castelos lendários são paisagens

Onde os homens se aquecem. Sós. Sumários

Porque da condição do homem, é o despojar-se.

 

A Manhã

(Jules Breton: pintor francês)

 

Referência:

 

HILST, Hilda. Quase bucólicas (I). In: __________. Exercícios. 1. ed. São Paulo, SP: MEDIAfashion, 2012. p. 159. (Coleção Folha ‘Literatura Ibero-americana’; v. 24)

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