Muitos se deixam
levar pela voluptuosidade, sinônimo primeiro do prazer sensual e dos desejos
sensoriais – força vital a afetar nossas existências da infância à morte –, numa
busca irrefreável por prazer e satisfação: o empenho por glória e fama, por
conquistas, por regalos à mesa, e, até mesmo, por beleza nos elementos da natureza
ou das artes são outros tantos veios, mencionados pelo falante, a convergirem
para o deleite dos sentidos.
Nessa esteira, a voz
lírica faz do poema um convite à volúpia, para que ganhe espaço em seus dias,
amplificando as suas inclinações pelos livros, pelo amor, pela música, pela
diversão, pela vida urbana e rural, assim como por qualquer outra forma de
prazer, tudo para enredar suas ações, aspirações e percepções num enlevo que se
pretende longevo.
J.A.R. – H.C.
Jean de La Fontaine
(1621-1695)
(por Hyacinthe Rigaud:
detalhe)
Invocation à la
Volupté
O douce Volupté, sans
qui, des notre enfance
Le vivre et le mourir
nous deviendraient égaux;
Aimant universel de
tous les animaux,
Que tu sais attirer
avec violence!
Par toi tout se meut
ici-bas.
C’est pour toi, c’est
pour tes appas
Que nous courons
après la peine;
Il n’est soldat ni
capitaine
Ni ministre d’Etat, ni
prince, ni sujet,
Qui ne t’ait pour
unique objet.
Nous autres
nourrissons, si, pour fruit de nos veilles,
Un bruit délicieux ne
charmait nos oreilles,
Si nous ne nous
sentions chatouillés de ce son,
Ferions-nous um mot
de chanson?
Ce qu’on appelle gloire
en termes magnifiques,
Ce qui servait de
prix dans les Jeux Olympiques,
N’est que toi,
proprement, divine Volupté.
Et le plaisir des
sens n’est-il de rien compté?
Pourquoi sont faits
les dons de Flore,
Le soleil couchant et
l’aurore,
Pomone et ses mets
délicats,
Bacchus, l’âme des
bons repas,
Les forêts, les eaux,
les prairies,
Mères des douces
rêveries?
Pourquoi tant de
beaux arts qui sont tous tes enfants?
Mais pourquoi les
Chloris aux appas triomphants
Que pour maintenir
ton commerce?
J’entends
innocemment: sur son propre désir
Quelque rigueur que l’on
exerce,
Encore y prend-on du
plaisir.
Volupté, Volupté, qui
fus jadis maîtresse
Du plus bel esprit de
la Grèce,
Ne me dédaigne pas,
viens-t’um loger chez moi;
Tu n’y seras pas sans
emploi;
J’aime le jeu, l’amour,
les livres, la musique,
La ville et la
campagne, enfin tout; il n’est rien
Qui ne me soit
souverain bien,
Jusqu’au sombre
plaisir d’um coeur mélancolique.
Viens donc; et de ce
bien, ô douce Volupté,
Veux-tu savoir au
vrai la mesure certaine?
Il m’um faut au moins
um siècle bien compté;
Car trente ans, ce n’est
pas la peine.
A Sensualidade
(Pompeo Batoni:
pintor italiano)
Invocação à Volúpia
Sem ti, doce Volúpia,
o viver e o morrer
Teriam, desde o
berço, idêntico valor:
De toda a criação,
universal pendor,
Com que força fatal,
tu consegues prender!
Tudo, por ti, aqui se
passa.
Por tua causa e tua
graça,
A duras penas todos
vão:
Não há soldado,
capitão,
Nem fidalgo, plebeu,
nem Ministro de Estado,
Que em ti não tenha o
olhar pregado
Das Musas na afeição,
se, de serões nascido,
Um agradável som não
nos encanta o ouvido,
E se ele não nos traz
amena sensação,
Tentamos nós uma
canção?
O que, pomposamente,
é chamado de glória
E, nos jogos
d’Olimpo, exalçava a vitória.
Precisamente, és tu.
Volúpia divinal.
E seu preço não tem o
prazer sensual?
E então por que os
dons de Flora,
O pôr-do-sol, a linda
Aurora,
Pomona e seus finos
manjares,
Baco, razão dos bons
jantares,
Florestas, fontes,
pradarias,
Mães de fagueiras fantasias?
Belas artes, por quê?
de quem és a nascente,
Por que tanta
beldade, amável, atraente,
Se não pra vires, até
nós, sempre morar?
Eis o meu parecer,
por mais procure alguém
O seu desejo
castigar,
Algum prazer inda lhe
vem.
Ó Volúpia gentil, que,
na Grécia de outrora,
De um pensador foste
senhora,
Não me desprezes não:
vem à minha morada,
Não ficarás sem fazer
nada:
Amo os livros, o
amor, música e diversão,
Cidade, campo, enfim;
o mundo nada tem
Que não me seja
enorme bem,
Mesmo o aflito prazer
de um triste coração.
Vem, pois, e desse
bem, ó Volúpia querida,
Queres então saber a
medida acertada?
Pelo menos preciso
uns cem anos de vida,
Pois trinta só é
quase nada...
Referência:
LA FONTAINE, Jean de. Invocation à la volupté / Invocação à volúpia. Tradução de Cláudio Veiga. In: VEIGA, Cláudio (Organização, seleção e tradução). Antologia da poesia francesa: do século IX ao século XX. Edição bilíngue: francês x português. 2. ed. ampliada. Rio de Janeiro, RJ: Record; Salvador, BA: Secretaria da Cultura e do Turismo, 1999. Em francês: p. 116 e 118; em português: p. 117 e 119.
❁
Nenhum comentário:
Postar um comentário