Uma mariposa a representar
a humana ambição, “temerária” e “cega” se desenfreada, deveras irracional
quando leva a ações perigosas e a suas contraproducentes consequências: Góngora
nos alerta para a importância de ter uma perspectiva mais equilibrada e consciente
de nossas aspirações, não as distendendo até as bordas da imprudência.
A busca da glória e
do êxito a qualquer preço, em contrapartida, tem a sua antípoda na acomodação e
no conformismo, geralmente observável em pessoas infensas a qualquer tipo de
mudança: diria Aristóteles, com aquele seu apreço ao meio termo, que nem tanto o
fogo da sôfrega vaidade a espicaçar temerariamente a vontade, nem tanto a inércia
ou o assentimento a um modo de vida sem quaisquer propósitos que façam a
diferença para os que estão à nossa volta, reflexo sem desvios de uma autoestima
debilitada.
J.A.R. – H.C.
Luis de Góngora y
Argote
Retrato de Diego
Velázquez
(1561-1627)
De la Ambición Humana
Mariposa, no sólo no
cobarde,
mas temeraria,
fatalmente ciega,
lo que la llama el
Fénix aún le niega,
quiere obstinada que
a sus alas guarde.
Pues en su daño
arrepentida tarde,
del esplendor
solicitada, llega
a lo que luce, y
ambiciosa entrega
su mal vestida pluma
a lo que arde.
¡Yace gloriosa en la
que dulcemente
huesa le ha prevenido
abeja breve,
suma felicidad a
yerro sumo!
No a mi ambición
contrario tan luciente,
menos activo, si
cuanto más leve,
cenizas la hará, si
abrasa el humo.
Abra as suas asas
(Jerome White: pintor
norte-americano)
Da Ambição Humana (*)
Mariposa, que além de
não covarde
é temerária,
fatalmente cega,
isso que a chama à
própria Fênix nega,
quer obstinada que
suas asas guarde.
Pois em seu dano
arrependida tarde,
pelo esplendor
solicitada, chega
ao que alumia e com
ambição entrega
sua mal vestida pluma
àquilo que arde.
Dorme gloriosa na que
docemente
fossa lhe preveniu
agulha breve,
suma felicidade a
erro sumo!
Não a minha ambição
claro oponente,
menos ativo, sim,
quanto mais leve,
em cinzas a fará, se
abrasa o fumo.
Nota do Tradutor (Péricles E. S. Ramos):
(*). Versos 3-4: não pensa que o fogo a atinja; 5-8: vai à chama e se
queima; 11-14: se errou, adquiriu a felicidade da morte; 10: preveniu agulha
breve: preparou-lhe a vida breve; 12-14: mas a ambição não tem fogo que a reduza
a cinzas. (GÓNGORA Y ARGOTE, 1988, n.r. à p. 81)
Referência:
GÓNGORA Y ARGOTE, Luis de. De la ambición humana / Da ambição humana. Tradução de Péricles Eugênio da Silva Ramos. In: __________. Poemas de Góngora. Tradução, introdução e notas de Péricles Eugênio da Silva Ramos. São Paulo, SP: Art Editora, 1988. Em espanhol: p. 80; em português: p. 81.
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