A evocar temas como a
ancestralidade, a escravidão nas terras do Caribe e a luta por liberdade, este
poema de Guillén retrata as suas memórias em relação aos ascendentes, sombras duais
que o acompanham, como reflexos de suas origens meio africanas, meio europeias:
de um lado, o avô negro com a sensação de sempre estar morrendo; de outro, o avô
branco, a expressar cansaço e desilusões no que diz respeito à marcha da
colonização.
Diferenças à parte –
e não são poucas! –, ao final do poema o falante reúne os avôs – nomeadamente
Federico e Facundo –, pondo-os a sonhar e a vaguear juntos, tudo para legar uma
mensagem de concórdia às gerações futuras: trata-se de um afã por igualdade, a
despeito das diferenças raciais, pois que, sendo humanos, têm eles os seus
propósitos de vida, compartilhados em sonhos, lamentos e cânticos.
Não se trata, nada
obstante, de esquecer as injustiças e os desafios enfrentados pelos povos
africanos e seus descendentes, erradicados à força de suas terras e levados a
trabalhos forçados em paragens distantes, senão de conhecer o passado, mantendo-se
o espírito aberto à conciliação, sem descuidar, evidentemente, do combate a
todas as formas ainda remanescentes de preconceito racial – lá como aqui!
J.A.R. – H.C.
Nicolás Guillén
(1902-1989)
Balada de los dos
abuelos
Sombras que solo yo
veo,
me escoltan mis dos
abuelos.
Lanza con punta de
hueso,
tambor de cuero y
madera:
mi abuelo negro.
Gorguera en el cuello
ancho,
gris armadura
guerrera:
mi abuelo blanco.
Pie desnudo, torso
pétreo
los de mi negro;
pupilas de vidrio
antártico
las de mi blanco.
Africa de selvas
humedas
y de gordos gongos
sordos...
– ¡Me muero!
(Dice mi abuelo
negro).
Aguaprieta de
caimanes,
verdes mañanas de
cocos...
– ¡Me canso!
(Dice mi abuelo
blanco).
Oh velas de amargo
viento,
galeón ardiendo en
oro...
– ¡Me muero!
(Dice mi abuelo
negro).
¡Oh costas de cuello
virgen
engañadas de
abalorios...!
– ¡Me canso!
(Dice mi abuelo
blanco).
¡Oh puro sol
repujado,
preso en el aro del
trópico;
oh luna redonda y
limpia
sobre el sueño de los
monos!
¡Qué de barcos, qué
de barcos!
¡Qué de negros, qué
de negros!
¡Qué largo fulgor de
cañas!
¡Qué látigo el del negrero!
Piedra de llanto y de
sangre,
venas y ojos
entreabiertos,
y madrugadas vacías,
y atardeceres de
ingenio,
y una gran voz,
fuerte voz,
despedazando el
silencio.
¡Qué de barcos, qué
de barcos,
qué de negros!
Sombras que sólo yo
veo,
me escoltan mis dos
abuelos.
Don Federico me grita
y Taita Facundo
calla;
los dos en la noche
sueñan
y andan, andan.
Yo los junto.
– ¡Federico!
¡Facundo! Los dos se
abrazan.
Los dos suspiran. Los
dos
las fuertes cabezas
alzan;
los dos del mismo
tamaño,
bajo las estrellas
altas;
los dos del mismo
tamaño,
ansia negra y ansia
blanca,
los dos del mismo
tamaño,
gritan, sueñan, lloran,
cantan.
Sueñan, lloran,
cantan.
Lloran, cantan.
¡Cantan!
Recital do Avô
(William Hemsley:
artista inglês)
Balada dos dois avôs
Sombras que só eu
vejo,
me escoltam meus dois
avôs.
Lança com ponta de
osso,
tambor de couro e
madeira:
meu avô negro.
Gorjeira no largo pescoço,
gris armadura
guerreira:
meu avô branco.
Pé desnudo, torso
pétreo,
os de meu negro;
pupilas de vidro
antártico,
as de meu branco.
África de selvas
úmidas
e de gordos e surdos
gongos...
– Estou morrendo!
(Diz meu avô negro).
Charco de caimões,
verdes manhãs de
cocos...
– Estou cansado!
(Diz meu avô branco).
Ó velas de amargo
vento,
galeão ardendo em
ouro...
– Estou morrendo!
(Diz meu avô negro).
Ó costas de colo
virgem
iludidas com vidrilhos...!
– Estou cansado!
(Diz meu avô branco).
Ó puro sol cinzelado,
preso ao anel dos
trópicos;
ó lua redonda e limpa
sobre o sonho dos
monos!
Quantos barcos,
quantos barcos!
Quantos negros,
quantos negros!
Que longo fulgor de
canas!
Que látego o do
escravagista!
Pedra de pranto e de
sangue,
veias e olhos
entreabertos,
e madrugadas vazias,
e entardeceres de engenho,
e uma grande voz,
forte voz,
despedaçando o silêncio.
Quantos barcos,
quantos barcos,
quantos negros!
Sombras que só eu
vejo,
me escoltam meus dois
avôs.
Dom Federico grita
comigo
e Taita Facundo se
cala;
os dois sonham noite
adentro
e vagueiam, vagueiam.
Eu os reúno,
– Federico!
Facundo! Os dois se
abraçam.
Os dois suspiram. Os
dois
erguem seus crânios robustos;
os dois do mesmo
tamanho,
sob as altas estrelas;
os dois do mesmo tamanho,
ânsia negra e ânsia
branca;
os dois do mesmo
tamanho,
gritam, sonham, choram,
cantam.
Sonham, choram,
cantam.
Choram, cantam.
Cantam!
Referência:
GUILLÉN, Nicolás. Balada
de los dos abuelos. In: __________. Man-making words. Selected poems of
Nicolás Guillén translated, annotated, with an introduction by Robert Márquez and
David Arthur McMurray. A bilingual edition: Spanish x English. La Habana, CU:
Editorial de Arte y Literatura, 1973. p. 66, 68 y 70.
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