Eis aqui um belo
poema a tratar das recordações, da relação entre pais e filhos, das sensações nostálgicas
da infância e da conexão emocional pela via do simbolismo de alguns objetos –
no presente caso, os chapéus usados pelo genitor do falante, sempre guardados na
parte de cima de seu armário –, os quais podem servir como portas de entrada
para intensas experiências emocionais.
Ao evocar as renitentes
conexões, quer em relação à figura paterna quer, por associação, em relação à
natureza, o poeta emprega imagens vívidas e detalhes sensoriais, recorrendo,
até mesmo, a referentes sagrados implicados numa atmosfera de ausência (pois
que, ao aludir ao “sono fabuloso” do pai, muito provavelmente se reporte ao seu
passamento).
J.A.R. – H.C.
Mark Irwin
(n. 1953)
My Father’s Hats
Sunday mornings I
would reach
high into his dark
closet while standing
on a chair and
tiptoeing reach
higher, touching,
sometimes fumbling
the soft crowns and
imagine
I was in a forest,
wind hymning
through pines, where
the musky scent
of rain clinging to
damp earth was
his scent I loved,
lingering on
bands, leather, and
on the inner silk
crowns where I would
smell his
hair and almost think
I was being
held, or climbing a
tree, touching
the yellow fruit,
leaves whose scent
was that of clove in
the godsome
air, as now, thinking
of his fabulous
sleep, I stand on
this canyon floor
and watch light
slowly close
on water I can’t be
sure is there.
Homem com o chapéu
(Fernando Amorsolo y
Cueto: artista filipino)
Os Chapéus de Meu Pai
Nas manhãs de
domingo, eu alcançava
o topo do seu armário
escuro servindo-me
de uma cadeira e, na
ponta dos pés, chegava
mais alto, tocando,
por vezes tateando
as copas macias, imaginando
encontrar-me num
bosque, com o vento a ressoar
entre os pinheiros,
onde o olor almiscarado
da chuva, agarrado à
terra úmida, semelhava-se
ao perfume dele de que
tanto gostava, renitente
nas fitas, no couro, nos
remates internos
de seda, nos quais
podia sentir o cheiro do seus
cabelos e quase
pensava estar sendo por ele sustentado,
ou escalando uma árvore,
tocando-lhe
os frutos amarelos,
as folhas cujo aroma
recendia a cravo numa
divina
atmosfera, como
agora, ao refletir sobre o seu sono
fabuloso, mantendo-me
de pé neste leito de cânion
a observar a luz se
fechar lentamente
sobre a água, da qual
não posso ter certeza se lá está.
Referência:
IRWIN, Mark. My father’s
hats. In: COLLINS, Billy (Sel. & Int.). Poetry 180: a turn back to
poetry. An anthology of contemporary poems. New York, NY: Random House, 2003. p.
202.
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