Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

sexta-feira, 7 de junho de 2024

Edward Thomas - Mal refulgiram na curva os arreios latonados da parelha

O poeta entabula um paralelo entre a vida a transcorrer nos dois distintos lados que se contrapõem durante um período de guerra (presume-se, a PGM): para os que lá se encontram, o emprego do gás de mostarda pelas unidades militares, como arma química contra os oponentes; para os que permaneceram nas herdades, o cultivo de mostardeiras selvagens para fins menos beligerantes.

 

De um lado, os que partiram para a frente de batalha, muitos dos quais não haverão de retornar, pois que abatidos nas trincheiras; do outro, aqueles que hão de levar à frente o lavradio dos campos, compondo um contingente de recursos humanos já mais limitado, com os consequentes entraves no desenvolvimento dos trabalhos domésticos.

 

A vida agrícola tem o seu ritmo alterado: pela conversa entre o lavrador e o orador do poema, especula-se sobre o que poderia ter sucedido na vida dos remanescentes na herdade, se a guerra não houvesse estourado. Mesmo no amor, há certa urgência na expressão dos sentimentos, pois que o dia de amanhã se prenuncia no presente como simples hipótese. Eis aí o mundo de ponta-cabeça!

 

J.A.R. – H.C.

 

Edward Thomas

(1878-1917)

 

As the team’s head-brass flashed out on the turn

 

As the team’s head-brass flashed out on the turn

The lovers disappeared into the wood.

I sat among the boughs of the fallen elm

That strewed an angle of the fallow, and

Watched the plough narrowing a yellow square

Of charlock. Every time the horses turned

Instead of treading me down, the ploughman leaned

Upon the handles to say or ask a word,

About the weather, next about the war.

Scraping the share he faced towards the wood,

And screwed along the furrow till the brass flashed

Once more.

The blizzard felled the elm whose crest

I sat in, by a woodpecker’s round hole,

The ploughman said. “When will they take it away?”

“When the war’s over.” So the talk began –

One minute and an interval of ten,

A minute more and the same interval.

“Have you been out?” “No.” “And don’t want to, perhaps?”

“If I could only come back again, I should.

I could spare an arm. I shouldn’t want to lose

A leg. If I should lose my head, why, so,

I should want nothing more... Have many gone

From here?” “Yes.” “Many lost?” “Yes, a good few.

Only two teams work on the farm this year.

One of my mates is dead. The second day

In France they killed him. It was back in March,

The very night of the blizzard, too. Now if

He had stayed here we should have moved the tree.”

“And I should not have sat here. Everything

Would have been different. For it would have been

Another world.” “Ay, and a better, though

If we could see all all might seem good.” Then

The lovers came out of the wood again:

The horses started and for the last time

I watched the clods crumble and topple over

After the ploughshare and the stumbling team.

 

Arando a terra

(John Atkinson: artista inglês)

 

Mal refulgiram na curva os arreios latonados da parelha

 

Mal refulgiram na curva os arreios latonados da parelha,

Os amantes desapareceram no interior do bosque.

Sentei-me entre as ramagens de um olmo caído

Que juncavam um rincão sobre a terra em pousio, e passei

A observar como o arado estreitava um talhão amarelo

De mostardeiras selvagens. A cada vez que os cavalos giravam,

Em vez de avançarem sobre mim, o lavrador se inclinava

Sobre as rabiças para externar ou pedir uma opinião

A respeito do tempo, logo depois em relação à guerra.

Raspando a relha, virou-se em direção ao bosque,

Dando voltas ao longo do sulco até que a lâmina voltasse

a brilhar.

A nevasca havia derrubado o olmo sobre cuja copa

Eu estava sentado, junto ao oco redondo de um pica-pau.

Disse-me o lavrador “Quando é que o levarão embora?”

“Quando acabar a guerra.” E assim iniciou-se a conversa –

Um minuto e depois um intervalo de dez;

Mais um minuto e então o mesmo tempo de espera.

“Estiveste na frente?” “Não.” “E acaso não quererias lá estar?”

“Se houvesse como assegurar-me da volta, decerto.

Não me importaria em prescindir de um braço. Não gostaria

De perder uma perna. Se viesse a perder a cabeça, bem, então

A nada mais faria sentido se apegar... Muitos daqui

Partiram?” “Sim.” “Muitos se perderam?” “Sim, uns quantos.

Somente duas parelhas trabalham na granja este ano.

Um de meus companheiros está morto. No segundo dia,

Mataram-no em França. Isso aconteceu em março,

Na mesma noite em que sobreveio a nevasca. Logo,

Se houvesse aqui permanecido, teríamos removido a árvore.”

“E eu não haveria de estar aqui sentado. Tudo

Teria sido diferente. Pois que se cumpriria

Um outro mundo.” “Certo, e melhor, embora se fôssemos

Capazes de vê-lo por inteiro, tudo pudesse parecer bom.”

Então os amantes, em regresso, saíram do bosque:

Os cavalos retomaram o trabalho e, pela última vez,

Vi o revolver e o assentar dos torrões de terra

Por trás do arado e da tropeçante parelha.

 

Referência:

 

THOMAS, Edward. As the team’s head-brass flashed out. In: HEANEY, Seamus; HUGHES, Ted (Eds.). The rattle bag. 1st publ. London, EN: Faber and Faber, 1982. p. 42-43.

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