A poesia é tanto uma
misteriosa manifestação do espírito, a vogar nos oceanos da imaginação, que as
mais expressivas acepções que se lhe possam fazer jus são originárias da...
própria poesia: não que ela se prenda à “circularidade” – como diz o poeta –, senão
porque a magia verbal em que encapsulada, o manejo das palavras para produzir
os tencionados efeitos na mente do leitor, não se prendem a rígidas leis, pois
que pelas águas do assombro navega o seu batel.
Eis a “mais libertina
das artes”, naquilo que dá voz ao pensamento criativo sem amarras, sem descuidar
das pautas da linguagem: uma terapia para fazer vibrar as “cordas da essência”,
um m.d.c. em potencial para o qual confluem todos os pincéis daqueles que, intentando
representar numa tela as perplexidades por meio das quais o mundo se nos
revela, acabam por encontrar a rosa mesma da beleza.
J.A.R. – H.C.
Márcio Catunda Gomes
(n. 1957)
Arte Poética
A poesia, a mais
libertina das artes,
dá cambalhotas, dança
no trapézio,
veste andrajos nos
salões.
Só tem por limite o
ilimitado.
Não tem arestas nem
se prende à circularidade.
salta sobre as
muralhas do jardim de Apolo.
A Dionísio faz curvar-se,
cerimonioso.
Tem de Narciso o
inatacável riso.
O lampejo fluido da
música
e a concretude da
iconografia.
Alimenta-se da
experiência
e quanto toca em si
transforma.
Bebe a luz do nada e
vibra nas cordas da essência,
em ressonância de
nervos e neurônios.
O circo
(Marc Chagall: pintor
bielorrusso-francês)
Referência:
GOMES, Márcio Catunda. Arte poética. In: __________. Plenitude visionária: poemas selecionados. Lisboa, PT: Companhia das Musas, 2007. p. 56.
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