Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

sábado, 25 de maio de 2024

Steve Kowit - A Lição de Gramática

Construído sob a forma tradicional de uma vilanela, o poema de Kowit aparenta ser, em primeira mirada, uma lição singela de gramática da língua inglesa, a albergar, em seu fecho, uma observação irônica do poeta sobre o “quase nada” que seriam as regras do inglês, muito embora se saiba que o precitado idioma se estende a bem muito mais que isso, tendo lá as suas dificuldades, como questões de ordem ortográfica, de ênfase, de sinônimos não necessariamente intercambiáveis, de homofonias etc.

 

No poema, “lata de beterrabas” espelha um claro sentido denotativo, muito embora se possa entender a expressão como uma metáfora para o continente onde inclusos todos os regramentos da sintaxe do idioma, ou ainda, as definições e as restrições da linguagem.

 

Quanto às “felpas lilases”, poderiam ser interpretadas como o elemento para além do puro tubérculo da beterraba, fazendo-a expandir-se a partir de seus próprios limites, de suas próprias regras. Afinal, quem já se dispôs a aprender o inglês, deve ter observado que o aprendizado não é apenas uma questão de conhecer as suas regras, senão também – e muito importante – uma questão de conhecer as suas muitas exceções às regras!

 

J.A.R. – H.C.

 

Steve Kowit

(1938-2015)

 

The Grammar Lesson

 

A noun’s a thing. A verb’s the thing it does.

An adjective is what describes the noun.

In “The can of beets is filled with purple fuzz”

 

of and with are prepositions. The’s

an article, a can’s a noun,

a noun’s a thing. A verb’s the thing it does.

 

A can can roll – or not. What isn’t was

or might be, might meaning not yet known.

“Our can of beets is filled with purple fuzz”

 

is present tense. While words like our and us

are pronouns – i.e. it is moldy, they are icky brown.

A noun’s a thing; a verb’s the thing it does.

 

Is is a helping verb. It helps because

filled isn’t a full verb. Can’s what our owns

in “Our can of beets is filled with purple fuzz.”

 

See? There’s almost nothing to it. Just

memorize these rules... or write them down!

A noun’s a thing; a verb’s the thing it does.

The can of beets is filled with purple fuzz.

 

Sala de aula: professora e seus alunos

(Carlin Blahnik: artista norte-americana)

 

A Lição de Gramática

 

Um substantivo é uma coisa. Um verbo é aquilo que ele faz.

Um adjetivo é o que descreve o substantivo.

Em “A lata de beterrabas está tomada por felpas lilases”,

 

de e por são preposições. A é um

artigo, Lata é um substantivo,

Um substantivo é uma coisa. Um verbo é aquilo que ele faz.

 

Uma lata pode rolar – ou não. O que não é, foi

ou pode vir a ser, pode a significar o que ainda não se conhece.

A frase “Nossa lata de beterrabas está tomada por felpas lilases”

 

acha-se no presente do indicativo. Enquanto palavras como

nosso e conosco

são pronomes correntes, vós tornou-se caduco e elus é de

um pardo nauseante. (*)

Um substantivo é uma coisa; um verbo é aquilo que ele faz.

 

Está é um verbo auxiliar. Ele oferece seus préstimos porque

tomada não é um verbo com sentido pleno. Lata é o que

nosso possui

em “Nossa lata de beterrabas está tomada por felpas lilases.”

 

Perceberam? Não há quase nada nisso. Apenas

memorizem essas regras... ou anotem-nas!

Um substantivo é uma coisa; um verbo é aquilo que ele faz.

A lata de beterrabas está tomada por felpas lilases.

 

Nota:

 

(*). Aqui há uma certa liberdade na tradução, pois o verso, no original, alude a particularidades do inglês, sem correspondências no português, a saber:

(i) “it” é um pronome neutro do caso reto, para a terceira pessoa do singular, que se emprega para fazer referência a animais, objetos, lugares, até mesmo a ideias e sentimentos;

(ii) “they”, idem, para a terceira pessoa do plural, sem caracterização de gênero, ou seja, se “eles” ou “elas”;

(iii) o emprego da forma “elus” (ou “iles”), na tradução, procura tornar neutro o gênero no âmbito da língua pátria, embora ainda não recepcionada pela gramática normativa do português, tudo para criar um paralelo semântico com o “they” do idioma inglês;

(iv) consigne-se que “elu”/“elus” (ou “ile”/“iles”) são pronomes neutros empregados contemporaneamente a pessoas não-binárias, ou melhor, que não se sentem pertencentes, exclusivamente, nem ao gênero masculino nem ao feminino.

 

Referência:

 

KOWIT, Steve. The grammar lesson. In: COLLINS, Billy (Selection and Introduction). Poetry 180: a turning back to poetry. An anthology of contemporary poems. New York, NY: Random House Trade Paperbacks, 2003. p. 225.

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