Lágrima que é
expressão do corpo e da alma em relação a tudo que os compunge, aqui como manifestação
de um coração que sofre e cujo lume se extingue a cada dia, ali como pingo de
suor à flor da pele; em qualquer dos casos, puro sal incorporado sob a luz do
sol – “salitre” como se diz –, medida de sabor a nos aquilatar o lado mais
humano e mortal.
Lágrima que não flui
de um pranto por um sonho irrealizado, por uma vida urdida em intenções, mas
que, de fato, não logrou sedimentar-se em história factual. Lágrima enquanto sal
calcinado traduzido em pedra, a calar fundo no espírito, sob um sol destilado
entre amaro e cristalino – lídimo inferno a sepultar, sempre mais um pouco, a
cada um de nós.
J.A.R. – H.C.
Octavio Paz
(1914-1998)
Lágrima
Sola, densa, redonda
lágrima,
quemada sal quemante,
límpido sol amargo,
cristalino,
por un cauce infinito
hacia nada rodando.
Su rastro es piedra
calcinada,
salitre bajo el sol.
¿Quién derramó esta
lágrima
que así se precipita
y recorre sin término
la aridez de la carne
o de la piedra,
sin que moje su fuego
el labio seco y
ávido?
No me llora esa
lágrima,
ni llora el sueño que
no he sido
ni la vida que soy.
Sal del alma al infierno
conmovida,
sabes, si sabes, a la
nada;
eres piedra y no
lágrima
y al corazón le pesas
como piedra,
pues no me lloras,
sino me sepultas.
(1941)
Homem chorando
(Virga Siauciunaite:
pintora lituana)
Lágrima
Só, espessa, redonda
lágrima,
queimado sal
queimante,
límpido sol amargo,
cristalino,
por um leito infinito
para nada rolando.
Seu rastro é pedra,
calcinada,
salitre sob o sol.
Quem derramou essa
lágrima
que assim se
precipita
e percorre sem
término
a secura da pedra, ou
a da carne,
sem que molhe seu
fogo
o lábio seco e ávido?
Não me chora esta
lágrima,
nem chora o sonho que
não fui
nem a vida que sou.
O sol da alma em
infernos destilado,
sabes, se é que
sabes, ao nada.
Pedra és, e não
lágrima,
e ao coração lhe
pesas como pedra,
porquanto não me
choras: me sepultas.
(1941)
Referências:
Em Espanhol
PAZ, Octavio.
Lágrima. In: Letras de México V (ene. 1945 - dic. 1946); VI (ene. 1947 -
mar. 1947). Edición facsimilar de la de 1981. México, D.F.: Fondo de
Cultura Económica (FCE), 2018. p 211. (Colección ‘Revistas Literarias Mexicanas
Modernas’; vols. 5 y 6)
Em Português
PAZ, Octavio.
Lágrima. Tradução de Aurélio Buarque de Holanda Ferreira. In: FERREIRA, Aurélio
Buarque de Holanda. Seleta em prosa e verso. Rio de Janeiro, RJ: José
Olympio; Brasília, DF: Instituto Nacional do Livro, 1979. p. 198.
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