Alpes Literários

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Subtítulo

UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

domingo, 5 de maio de 2024

Fabrício Corsaletti - Poesia e sociedade

Em versos parelhas que alternam situações ou contextos da vida social na cidade grande e cogitações de se mudar para uma cidade menor ou para o campo, com o objetivo de viver uma vida mais simples, quase ao nível do meramente natural, o falante acaba por revelar evidências de uma responsabilidade por seu genitor (ou quem mais) que já não se observa habitual entre os filhos das gerações mais recentes.

 

A sensação que se nos apodera ao término dos versos é a de um ente lírico não exatamente em paz consigo mesmo ou com o seu mister, ávido por trocar a paisagem capturada por seus olhos (ou pelo coração), talvez em decorrência de um conflito com a sua própria identidade de poeta, não tão em ênfase nas contemporâneas sociedades de consumo.

 

J.A.R. – H.C.

 

Fabrício Corsaletti

(n. 1978)

 

Poesia e sociedade

 

os móveis abandonados

e os óculos dos doentes

 

– não são imagens

do meu remorso

 

as janelas basculantes

e as grades dos edifícios

 

– vou criar porcos

em Araraquara

 

as embalagens de plástico

e as obras de artistas plásticos

 

– quero que a moça do telemarketing

venha comigo

 

as garagens numeradas

e as vozes do linchamento

 

– ouvirei o canto do galo

com amargura

 

a simpatia dos garçons

e o riso das professoras

 

– devo estar preparado

para acolher meu pai

 

as reuniões de condomínio

e os últimos lançamentos

 

– meu único gesto sincero

depende de garfo e faca

 

Estação de Charing Cross (Londres)

(Cathy Read: artista inglesa)

Referência:

 

CORSALETTI, Fabrício. Poesia e sociedade. In: __________. Esquimó. São Paulo, SP: Companhia das Letras, 2010. p. 41.

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