Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

segunda-feira, 20 de maio de 2024

Mário Cesariny - Juntemos este leito estas cidades

Num discurso a propor a recolha de toda a “espuma dos dias”, teses construídas sobre fundamentos que se pretendem fidedignos à realidade – olhares, cenários citadinos, êxtases, sentimentos de amor, “tudo isso” –; idem, o que se tem por suas respectivas antíteses, por elaborações contrapostas a tais construções pretensamente irrefutáveis – “nada disto” –; o poeta aparenta ceder à nebulosa dos sonhos o mister de sintetizar o significado pleno de todas essas experiências.

 

Sobre o leito, o sono e o sonho: nas horas de recolhimento, a maré, o refluxo do que se passou em vigília, no espaço mais íntimo de cada ser, nossas mentes povoadas por símbolos capazes de nos dizer se estamos ou não em pleno autocontrole psíquico, ou como diria Jung, se, em nosso veleiro, há suficiente equilíbrio entre a vela e a quilha.

 

J.A.R. – H.C.

 

Mário Cesariny

(1923-2006)

 

Juntemos este leito estas cidades

 

Juntemos este leito estas cidades

os países os mares as poesias

juntemos o fiambre e o lírio roxo

a morte em plena rua e a vida hermética

 

Juntemos peça a peça as armas todas

todo o sol todo o tempo que há na terra

juntemos o riacho e a areia viva

juntemos toda a música

 

Juntemos o que há sobre o que espera

como um bicho na noite antena tensa

pata tensa um centímetro de pata

 

Gládio ou desgosto ou só meia verdade

teu riso minha coleta juntemos

isso tudo tudo isso nada disto.

 

Interior com o leito e as luzes da cidade

(Victoria Sukhasyan: artista russa)

 

Referência:

 

CESARINY, Mário. Juntemos este leito estas cidades. In: __________. Nobilíssima visão. Lisboa, PT: Guimarães, 1959. p. 71-72.

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