Depois de um retrato
lancinante sobre a morte, essa filha da noite, trágica componente do existir
humano – quer pelo aspecto natural quer pela ótica pessoal –, enquanto ponto terminante
para qualquer contexto que se avalie como positivo, o poeta vislumbra nas
palavras o poder de avançar para além de toda ruína, nelas entrevendo a aptidão
para escapar às limitações do tempo.
Não exatamente as
palavras lançadas ao vento – presume-se –, senão aquelas gravadas indelevelmente
na página em branco, ou por outra, já agora em outros meios, difundidas na
galáxia da internet e convertidas no constituinte móvel da presença humana
sobre a terra, presença essa que, confiante, projeta-se à jurisdição imóvel da
eternidade.
J.A.R. – H.C.
Simón Zavala Guzmán
(n. 1943)
Más allá de la muerte
Siempre la muerte
acecha. Con su boca abismal
está lista para el
hachazo
para el golpe certero
que debe enmudecernos.
Siempre está atenta
para robarnos en el primer descuido
en el primer temor
en la primera
desmesura
la luz que nos empuja
la marejada vital que
nos irrumpe
el hálito que impulsa
nuestra palabra
como un golpe de
tambor sonoro y conmovido.
Siempre está a
nuestro lado fría y astuta
húmeda y obsesionada
con nuestro calor
queriendo
deslumbrarnos desde su desnudez
desde el cadáver de
su beso
tratando de
inmovilizamos con su excitación
sexo imperceptible
senos transparentes
con su oculto lenguaje
donde un ángel letal
alza su espada de terror
para decapitamos.
Siempre queriendo
aprisionarnos en su insinuación
en su propósito de
hacernos piedra polvo en olvido
deseo y laberinto de
ojos inmóviles
verdad de su
primigenio vientre.
Siempre la muerte
acecha.
Fascinada frente al
mortal lame su abstinencia.
Repta bajo las
pisadas del cuello que ha resuelto apretar.
No tiene prisa.
Espera. Se sabe indestructible.
Sin embargo no nos
puede vencer
en el momento de su
abrazo conmovedor
de la asfixia que
comienza a triturar nuestros sentidos
los silencios se
abren, insurgen bravas las palabras
y la voz se desata
como un vendaval de sangre invulnerable
y vuelve la vida a
crecer sobre la eternidad
sobre la muerte que
queda en su despecho
como sombra
herrumbrosa y risible.
A Eternidade e a
Morte
(Xavier Mellery: pintor
belga)
Mais além da morte
A morte está sempre à
espreita. Com a sua boca abismal
sempre pronta para o
talho
para o golpe certeiro
que há de nos silenciar.
Está sempre alerta
para nos roubar ao primeiro descuido
ao primeiro temor
à primeira
imprudência
a luz que nos impele
a maresia vital que
nos irrompe
o sopro que dá
impulso à nossa palavra
como uma sonora e
comovente batida de tambor.
Está sempre ao nosso
lado fria e astuta
úmida e obcecada com
o nosso calor
querendo nos
deslumbrar a começar por sua nudez
a começar pelo
cadáver de seu beijo
tratando de nos
imobilizar com sua excitação
sexo imperceptível
seios transparentes
com sua oculta linguagem
onde um anjo letal
ergue a sua espada de terror
para nos decapitar.
Sempre querendo nos
aprisionar em sua insinuação
em seu propósito de nos
converter em pedra pó olvido
desejo e labirinto de
olhos imóveis
verdade de seu
primigênio ventre.
A morte está sempre à
espreita.
Fascinada frente ao
mortal ela lambe sua abstinência.
Rasteja sob os rastos
da fauce que resolveu apertar.
Não tem pressa.
Espera. Sabe-se indestrutível.
Contudo não nos pode
vencer:
no momento de seu
abraço comovente
da asfixia que começa
a esmagar nossos sentidos
os silêncios se
abrem, insurgem-se bravas as palavras
e a voz se solta como
um vendaval invulnerável de sangue
e a vida volta a
crescer sobre a eternidade
sobre a morte que em
seu despeito
mantém-se como sombra
enferrujada e risível.
Referência:
GUZMÁN, Simón Zavala.
Más allá de la muerte. In: BIANCHI, Roberto et alii. Círculo de poesía 9.
Montevideo, UR; Brasília, BR: aBrace, 2007. p. 105-106. (‘Círculos de edición
aBrace’)
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