Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

domingo, 12 de maio de 2024

Eugenio Montale - À Minha Mãe

Estas linhas dão fecho à seção “Finisterra” do poemário “A tempestade e outros poemas”, publicado em 1956, a recolher poemas redigidos por Montale entre 1940 e 1956, cobrindo, por conseguinte, um período em que o mundo se engolfou numa guerra insana (GM II) – objeto de alusão em dois dos versos da primeira estrofe.

 

Aos mortos somente resta a memória dos que aqui permanecem, talvez bem mais atentos aos apelos do corpo do que aos da alma. A única vida futura dos mortos está nas recordações dos vivos e somente nelas a mãe do falante sobreviverá. Ademais, no além-túmulo, o que importa o que aconteça aos despojos, essa “sombra” que a tudo encobre neste plano de existência? Afinal, a natureza os reduzirá a pouco mais do que átomos.

 

Mas para quem acredita em vida após a morte – como a mãe do poeta –, a alma constitui o liame que haverá de prover essa hipotética continuidade (ideia de transcendência não propriamente recepcionada por Montale, haja vista o matiz imanente presente nas últimas linhas do poema).

 

J.A.R. – H.C.

 

Eugenio Montale

(1896-1981)

 

A Mia Madre

 

Ora che il coro delle coturnici

ti blandisce nel sonno eterno, rotta

felice schiera in fuga verso i clivi

vendemmiati del Mesco, or che la lotta

dei viventi più infuria, se tu cedi

come un’ombra la spoglia

(e non è un’ombra,

o gentile, non è ciò che tu credi)

 

chi ti proteggerà? La strada sgombra

non è una via, solo due mani, un volto,

quelle mani, quel volto, il gesto d’una

vita che non è un’altra ma se stessa,

solo questo ti pone nell’eliso

folto d’anime e voci in cui tu vivi;

 

e la domanda che tu lasci è anch’essa

um gesto tuo, all’ombra delle croci.

 

In: “La bufera e altro” (1940-1954)

 

Mãe e Filho

(Mary S. Cassatt: pintora norte-americana)

 

À Minha Mãe

 

Agora que o coro das perdizes sardas

embalam-te no sono eterno, álacre

e perfilada dispersão em fuga rumo às encostas

vindimadas do Mesco, agora que a luta

dos vivos mais se acirra, se renunciares

como uma sombra aos despojos

(e não são uma sombra,

ó senhora, não são o que acreditas que sejam)

 

quem haverá de proteger-te? A estrada desimpedida

não é uma via, somente duas mãos, um rosto,

aquelas mãos, aquele rosto, o gesto de uma

vida que outra não é senão ela mesma,

tudo isto a te situar no elísio

repleto de almas e de vozes onde vives;

 

e a pergunta que deixas é, também ela,

um gesto teu, à sombra das cruzes.

 

Em: “A tempestade e outros poemas” (1940-1954)

 

Referência:

 

MONTALE, Eugenio. A mia madre. In: __________. Tutte le poesie. A cura di Giorgio Zampa. Milano, IT: Arnoldo Mondadori Editore, ottobre 1990. p. 211. (‘Grandi Classici Oscar Mondadori’)

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