Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quarta-feira, 22 de maio de 2024

Raïssa Maritain - Chagall

Ambos russos de ascendência judaica, Raïssa e Chagall demonstram sentimentos assemelhados no que pertine a certo misticismo judaico-cristão, no qual se mesclam simbolismos presentes no Novo e no Antigo Testamentos, a exemplo dos que se traduzem por meio da menorá, dos anjos e de todos as efígies retratadas, v.g., nas cenas da tela “Crucificação Branca” do artista, a ilustrar esta postagem.

 

Não se pode negar a capacidade de Raïssa – esposa do filósofo de orientação católica Jacques Maritain (1882-1973) – em verter para palavras, ou melhor, em poesia, aquilo que se estampa na prolífica arte figurativa de Chagall (1887-1985), muito a evocar a condição do povo judeu, vitimado por violências e abusos ao longo da História.

 

J.A.R. – H.C.

 

Raïssa Maritain

(1883-1960)

 

Chagall

 

Chagall est venu à grands pas

De la Russie morose

Il a dans sa besace

Des violons et des roses

Des amoureux plus légers que des anges

Et des mendiants en redingote

Des musiciens et des archanges

Et des synagogues

 

Il a des prés et des villages

Qui chavirent dans l’orage

Des cabarets des bals des belles

Des fenêtres dans l’arc-en-ciel

 

Le trône de lys de la Fiancée

Sous le dais de soie empourprée

Toute la Bible en images

Tous les grands personnages

En longues barbes en longues robes

Et leurs agneaux et leurs colombes

Des coqs diaprés et des vaches

Les animaux de La Fontaine et ceux de l’Arche

Des foules des noces des larmes des baisers

Des chevaux chimériques

Des dames et des cavaliers

Et des cirques

Il a peint l’univers entier

Rien n’y manque

Avec toutes les couleurs du soleil

Qui y dansent

 

Puis il a un Christ étendu

À travers le monde perdu

Dans un grand espace d’ivoire

À ses pieds un chandelier allumé

À six bougies par mégarde

Et dans le ciel des hommes éplorés

Qui regardent

 

Aux quatre coins de l’horizon

Feu et flammes

De pauvres Juifs de partout s’en vont

Personne qui les réclame

Ils n’ont plus de lieu sur la terre

Pour se reposer pas une pierre

Les Juifs errants

Il faut donc qu’ils logent au ciel

Morts ou vivants

Avec ces amis de Chagall

Qui ici-bas se tiennent si mal

Qui sont toujours en l’air dans les nuages

   

Ces rabbins pensifs

Et ces violonistes

Qui jouent sur leur coeur dans la neige

 

Dans: “Lettre de nuit” (1939)

 

Crucificação Branca

(Marc Chagall: pintor franco-russo)

 

Chagall

 

Chagall veio a passos largos

Da Rússia taciturna

Trazendo em seu alforje

Violinos e rosas

Amantes mais leves que anjos

Mendigos com sobrecasacas

Músicos arcanjos

E sinagogas

 

Ele tem prados e aldeias

Que soçobram sob o temporal

Cabarés bailes beldades

Janelas no arco-íris

 

O trono de lírios da Noiva

Sob o dossel de seda carmesim

Toda a Bíblia em imagens

Todos os grandes protagonistas

Com longas barbas em longas túnicas

E seus cordeiros e suas pombas

Galos matizados e vacas

Os animais de La Fontaine e os da Arca

Multidões bodas lágrimas beijos

Cavalos quiméricos

Damas e cavalheiros

E os circos

Ele pintou o universo inteiro

Nada a faltar

Com todas as cores do sol

Que nele cintilam

 

Ademais conta ele com um Cristo jacente

Em meio ao mundo perdido

Num vasto espaço de marfim

A seus pés um castiçal aceso

Inadvertidamente com seis velas

E no céu homens lacrimosos

A observarem o que se passa

 

Pelos quatro cantos do horizonte

Fogo e chamas

Pobres Judeus emigrantes por todo lado

Sem ninguém que os reivindique

Já não têm um lugar na terra

Nem uma pedra para o repouso

Destarte os Judeus errantes

Têm de se alojar no céu

Mortos ou vivos

Como esses amigos de Chagall

Que estão aqui embaixo tão mal seguros

Sempre no ar suspensos entre nuvens

 

Esses rabinos pensativos

E esses violinistas

Que na neve harpejam sobre seus corações

 

Em: “Carta da noite” (1939)

 

Referência:

 

MARITAIN, Raïssa. Chagall. In: MARITAIN, Jacques et Raïssa. Oeuvres complètes. Volume XV: 1945-1960. Fribourg, CH: Éditions Universitaires; Paris, FR: Éditions Saint-Paul, 1995. p. 551-552.

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