Um poema extraído ao
primeiro poemário de Drummond – “Alguma Poesia”, de 1930 –, que, à primeira
vista, parece-nos singelo demais para a lavra do poeta mineiro, mas que carrega
um sentido relevante quando se o interpreta a desvelar o embate que se processa
no humano espírito entre as forças do bem e as do mal, ou – como diria Freud –
entre as pulsões da vida e as da morte, entre Eros e Thanatos.
Catarse é tudo a que
se referem os versos, desde o título atribuído pelo autor ao poema: no ponto de
chegada, outra parte de nós, que nos sutura as lesões, cobrindo-as com “pensos”
(curativos) – o “pensar” do penúltimo verso alude a uma tal ação –, para que,
em síntese, possa surgir o homem puro, enquanto luz que ilumina o mundo (Mt. 5:13).
J.A.R. – H.C.
Carlos Drummond de
Andrade
(1902-1987)
Poema da Purificação
Depois de tantos
combates
o anjo bom matou o
anjo mau
e jogou seu corpo no
rio.
As águas ficaram
tintas
de um sangue que não
descorava
e os peixes todos
morreram.
Mas uma luz que
ninguém soube
dizer de onde tinha
vindo
apareceu para clarear
o mundo,
e outro anjo pensou a
ferida
do anjo batalhador.
Os anjos bom e mau
(William Blake: poeta
e artista inglês)
Referência:
ANDRADE, Carlos
Drummond de. Poema da purificação. In: __________. Alguma poesia.
Posfácio de o Eucanaã Ferraz. 1. ed. São Paulo, SP: Companhia das Letras, 2013.
p. 78.
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