Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

sexta-feira, 24 de maio de 2024

Hermann Hesse - Retrospecto

Muitos são os poemas de Hesse que dizem respeito aos temas da brevidade da vida, da memória e da ligação com o passado, a exemplo deste: nas metáforas que se associam ao irromper do ocaso, pode-se vislumbrar o estado d’alma saudosista do falante, a relembrar os verdes anos da infância e da juventude, quando já vai a meio a década que precede a casa dos sessenta.

 

Por trás dessa “névoa da aurora” que tende a se atualizar, pressente-se um apegado anelo pelo perene, a despeito de a voz lírica perceber com clareza o ciclo do “florir” e do “murchar”, presente neste “amplo jardim de Deus”, como se tencionasse ratificar, sob tal dicção, a ideia de que somos a gleba sobre a qual o Eterno leva à frente a sua contínua obra de criação.

 

J.A.R. – H.C.

 

Hermann Hesse

(1877-1962)

 

Rückgedenken

 

Am Hang die Heidekräuter blühn,

Der Ginster starrt in braunen Besen.

Wer weiß heut noch, wie flaumiggrün

Der Wald im Mai gewesen?

 

Wer weiß heut noch, wie Amselsang

Und Kuckucksruf einmal geklungen?

Schon ist, was so bezaubernd klang,

Vergessen und versungen.

 

Im Wald das Sommerabendfest,

Der Vollmond überm Berge droben,

Wer schrieb sie auf, wer hielt sie fest?

Ist alles schon zerstoben.

 

Und bald wird auch von dir und mir

Kein Mensch mehr wissen und erzählen,

Es wohnen andre Leute hier,

Wir werden keinem fehlen.

 

Wir wollen auf den Abendstern

Und auf die ersten Nebel warten.

Wir blühen und verblühen gern

In Gottes großem Garten.

 

(9.8.1933)

 

Jardim dos Deuses

(Cindy Welch: pintora norte-americana)

 

Retrospecto

 

Na encosta vão desabrochando as urzes

e a giesta se eriça em tufos pardos:

quem é que lembra ainda o verdejante

frouxel do bosque em maio?

 

Quem lembra ainda como é que soavam

o pio do cuco e o canto do melro?

O que era som de tanto encantamento

está findo e esquecido.

 

A festa da tarde estival na mata

com lua cheia em cima da montanha,

quem anotou? Quem fixou? Quem guardou?

Tudo está terminado.

 

Também de ti e de mim, daqui a pouco

ninguém há de lembrar-se nem falar:

outros virão morar aqui e ninguém

sentirá nossa falta.

 

Esperamos pela névoa da aurora

e pela estrela da tarde nos céus:

de bom grado florimos e murchamos

no amplo jardim de Deus.

 

(9.8.1933)

 

Referências:

 

Em Alemão

 

HESSE, Hermann. Rückgedenken. In: __________. Die gedichte: 1892-1962. 19. auflage. Frankfurt am Main, DE: Suhrkamp, 1977. s. 618.

 

Em Português

 

HESSE, Hermann. Retrospecto. Tradução de Geir Campos. In: __________. Andares: antologia poética. Tradução e prólogo de Geir Campos. Rio de Janeiro, RJ:  Nova Fronteira, jan. 1976. p. 173.

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