Em duas quadras metrificadas
em redondilhas maiores e rimadas apenas nos versos pares, a poetisa capixaba
espelha numa árvore aquilo que, porventura, fosse um ideal próprio de vida, decerto
um tanto estoico, a encerrar a mira de impassibilidade frente aos acontecimentos
que esculpem a história de cada qual – sustentada por aquela escola filosófica.
A rigor, apesar de
não estar absolutamente convicto de que a epigrama em apreço não se alinha à
definição mais comum que lhe é atribuída (a saber, um poema curto de teor satírico,
irônico ou mordaz – quando então o propósito da autora teria sido bem diverso ao
acima apontado), penso que a valoração do que seja “bom”, no que tange à
conduta humana, merecesse algum reparo: não há propriamente ventura em se viver na inconsciência da grandeza de quem se é, tanto
mais sozinho, como se o propósito fosse lançar um repto ao Gn. 2:18.
J.A.R. – H.C.
Marly de Oliveira
(1935-2007)
Epigrama
Bom é ser árvore,
vento,
sua grandeza
inconsciente;
e não pensar, não
temer,
ser, apenas:
altamente.
Permanecer uno e
sempre
só e alheio à própria
sorte,
com o mesmo rosto
tranquilo
diante da vida ou da
morte.
Em: “Cerco da
Primavera” (1957)
A Árvore Solitária
(Caspar D. Friedrich:
pintor alemão)
Referência:
OLIVEIRA, Marly de.
Epigrama. In: OLIVEIRA, Marly de. Antologia poética. Organização e
prefácio de João Cabral de Melo Neto. Rio de Janeiro, RJ: Nova Fronteira, 1997.
p. 18.
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