De Fernando Pessoa,
detentor de um estado mental multivariado, a poetisa carioca apreende saudades
de saudades, recordações nostálgicas translativas que, em primeiro grau, surgem abstraídas à distância – pois que Lisboa é o seu ponto de mirada preferencial, janela que se
abre a um estuário de cenas transmutadas a uma cornucópia de outros tantos
vislumbres –, mas que logo após associam-se a uma cidade jamais visitada pelo
poeta lusitano – Paris.
A perplexidade tencionada
pela poetisa carioca à mirada do leitor, como se percebe, resulta da presunção em
se ter saudade de um sítio perante o qual se está presente – e não em outro
tempo e/ou lugar –, assim como se ter saudade de um lugar onde nunca se esteve,
do qual somente a imaginação poderia suscitar suspiros nostálgicos: ah... o visionário
que assoma da pena de poetas daqui e de além-mar!
J.A.R. – H.C.
Lélia Coelho Frota
(1938-2010)
A janela de Fernando
Pessoa
Estar em Lisboa
era ter saudade de
Paris.
Quis
o destino de um amor
brotado
como ervas, à beira
do rio súbito,
a confundir a calma
da longa degustação
da própria alma
que estar em Lisboa
fosse ter saudade de
Lisboa
onde se tinha saudade
de Paris.
O olhar para fora
(Henry Scott Tuke:
pintor inglês)
Referência:
FROTA, Lélia Coelho.
A janela de Fernando Pessoa. In: __________. Poesia reunida: 1956-2006.
1. ed. Rio de Janeiro, RJ: Bem-Te-Vi, 2012. p. 407.
❁
Nenhum comentário:
Postar um comentário